I
Tornou-se uma prática corrente atacar os adversários quando falham os argumentos e os factos não ajudam a manter a narrativa que se pretende. Já muito se disse e se escreveu a propósito do incêndio que deflagrou no dia 4 de maio no Hospital do Divino Espírito Santo. Os açorianos, infelizmente, continuam a sofrer as consequências deste flagelo. Volvidos mais de 6 meses, são mais as perguntas do que as respostas. É próprio de uma sociedade exigente que nos interroguemos, não só sobre as causas, mas, também, sobre as opções seguidas e as soluções apresentadas, para responder a um problema que afeta todos. Quem governa deve esclarecer sem ficar melindrado por haver quem questione e sem considerar inimigo quem discorda. É assim nas sociedades democráticas. Querer, como alguns gostariam, que não haja debate, nem perguntas, e que reine um silêncio “bem-comportadinho”, em que todos se rendem a uma pretensa e pretensiosa infalibilidade de quem governa tem outro nome, mas não se chama democracia.
II
Uma das muitas questões em torno do incêndio no HDES diz respeito à ativação ou não do Fundo de Solidariedade Europeu (FSUE). Vamos, então, aos factos. Cinco dias depois do incêndio, no dia 9 de maio, o então candidato ao Parlamento Europeu, meu vizinho nesta página, divulgou uma nota de imprensa na qual se podia ler: “O social-democrata já contactou “os Serviços da Comissão Europeia para um eventual pedido de ativação do Fundo de Solidariedade” que poderá ser apresentado “após o levantamento de todos os prejuízos, com o prazo de 12 semanas para verificar os respetivos critérios de elegibilidade”.
III
No dia seguinte, aos microfones da Antena 1 Açores, tive oportunidade de, sobre esta matéria, dizer: “é bom também explicar um pouco melhor que o Fundo de Solidariedade tem um conjunto de critérios muito rigorosos, desde logo no seu valor mínimo, que tem de ser o Estado Membro a solicitar o acionamento do Fundo de Solidariedade e que isso também só acontece depois de ser feito um levantamento muito rigoroso e muito exaustivo. Julgo, portanto, que é preciso cuidado ao fazermos essas referências porque também não podemos gerar expectativas que podem depois não corresponder, pode não ser o instrumento mais adequado para corresponder às expectativas que vão sendo geradas”.
IV
Mais tarde, no dia 11 de setembro, várias notícias dão conta que o meu colega eurodeputado refere que a UE se negou a ativar o Fundo de Solidariedade. Para melhor se perceber, cito: “Houve solidariedade nacional, mas quando a solicitámos à União Europeia esta foi-nos negada por não preenchermos os critérios de elegibilidade”.
V
Ora, esta semana, em resposta a uma questão que formulei por escrito à Comissão Europeia, ficámos todos a saber que “As autoridades portuguesas não solicitaram a assistência do FSUE para esta catástrofe”.
VI
Ou seja, tal como afirmei em maio, para pedir a ativação do FSUE era necessário preencher critérios muito rigorosos e a sua ativação depende, obviamente, de um pedido formal por parte do Estado-membro, o que não sucedeu. Este esclarecimento público é devido porque, também neste caso, os responsáveis políticos têm que agir com particular cuidado para não defraudar expectativas nem, por outro lado, criar “cortinas de fumo” e gerar uma perceção errada quanto a uma ativação que não ocorreu e ao recurso aos instrumentos comunitários.
VII
Quanto ao resto, podemos não estar sempre de acordo - e muitas vezes não estamos -, mas não me passa pela cabeça confundir discordâncias com desqualificações e ataques pessoais. Também aqui, obviamente diferentes.