Não poderia estar mais de acordo. Duzentos por cento de acordo, se efetivamente possível for um grau de concordância com determinada coisa em dobro ao próprio limite superior da escala estabelecida. "Diferenças substantivas entre o discurso e a realidade do ensino nos Açores", mensagem sublinhada, há dias, pela voz do senhor presidente do Sindicato dos Professores da Região Açores. É isto, exatamente, o que define a situação. Trezentos por cento de acordo. Decidi somar-lhe agora cem, como se duzentos por cento não fossem mais do que suficientes para exprimir o meu grau de concordância. Constrangedor, no entanto, é o facto de dois anos volvidos e eu ainda nunca ter conseguido compreender se a senhora secretária da Educação (de seu nome Sofia) terá em si a perfeita noção da evidente disfunção entre o mundo real e aquele outro pela própria propagandeado como sendo o existente. No fundo, se há ou não consciência, por parte destes novos Sofistas, do vazio existente entre aquilo que tanto e tanto semeiam de belas palavras e o mundo real onde caminhamos de pés bem rasantes ao solo, raras vezes alcatifado. Pode ser que um dia se faça luz. Pode ser. Porém, porém, lamentável é o facto do verdadeiro problema não residir no transportar ou não transportar em mim desta extravagante dúvida existencial, mas sim na preocupante existência do próprio problema. É que, se aos olhos de quem tem o poder de decidir, tudo é belo e primaveril quando, na realidade, se atravessa um inverno duro de obstáculos por ultrapassar, não se augura bom fim. Faz lembrar assim qualquer coisa como aquele inafundável transatlântico Titanic, em que seu comandante, por falta de acesso aos indispensáveis binóculos, veria, muito provavelmente, belos flocos de neve flutuando à superfície das águas, no lugar dos reais e preocupantes icebergues.
Não, não sou profeta da desgraça, não sou, ou ainda muito menos eventual recalcado emissor de maldições para a Educação Açores, equivalente ao que para o futebol do Benfica estaria o alcunhado de feiticeiro Béla Guttmann. Não sou, nem quero ser, ainda que eventualmente estivesse carregadíssimo de razão. Não há nisto qualquer espécie vantagem ou prazer. O que se deseja, intensamente, é de assistir ao nosso sistema educativo rolando, carris certos acima, seja ele quem for o maquinista. O preço do desastre é demasiado grande para que algum dividendo político se possa sobrepor à vontade de assistir aos nossos alunos galgarem para patamares mais altos de sucesso. Ilógico seria se assim não fosse, qual impávido passageiro que, perante o iminente despenhar do avião onde viaja, justifica toda a sua tranquilidade através do simples argumento de que nada de grave para si se passa visto que, afinal de contas, nada daquilo é seu.
Precisamos de frontalidade. Ambição, otimismo, mas sempre frontalidade. Assumam-se as dificuldades, proponham-se as soluções, mas que se não enterre a cabeça na areia basáltica mais próxima fazendo crer, na oratória, de que a realidade é exatamente aquilo que fantasiamos.