Para que daqui a dez anos não estejamos a depender do FMI, é preciso lembrar o passado e tirar as respectivas ilações, tendo em conta os vários pontos de contacto que existem entre a crise de 1983/1984 e a actual.
Voltemos, assim, atrás.
Basta ler alguma imprensa da altura e alguns documentos públicos sobre aquele período da história do nosso país para percebermos que Portugal assistia a uma rápida deterioração do desempenho da economia portuguesa em 1980 e 1982. O país chegou a esta situação-limite devido a um forte aumento do défice da administração pública, à deterioração das finanças das empresas públicas, perda de competitividade externa e controles inadequados sobre o endividamento externo. Além disso, a debilidade política do governo dificultou as correcções atempadas das políticas económicas.
Chegados a este ponto, em 1983, o novo governo de coligação PS/PSD anunciou um pacote de medidas de emergência e o começo de negociações com o FMI para apoio financeiro que entre 83 e 84 foi equivalente a 650 milhões de dólares, 3,5 do PIB e quase o dobro do nível das reservas internacionais do país em 1983.
Este acordo, de forma sucinta, implicou aumento de alguns impostos, proibição de novas contratações e moderação salarial, cortes dos investimentos e controles do endividamento, aperto dos tectos ao crédito interno e aumentos das taxas de juro e desvalorização pontual de 13 por cento do escudo em relação às moedas dos principais parceiros comerciais. O programa incluía, também, compromissos do governo para a adopção de medidas de médio prazo para corrigir debilidades estruturais.
Esta foi a receita aplicada a Portugal. Certamente com muitos pontos de contacto com a actualidade.
A questão que se coloca, agora, é se Portugal tem capacidade para estar, em cada década, a recorrer a ajuda externa. Até quando isso será possível? Já são evidentes os sinais na Europa que esta ajuda externa não está a ser bem vista em muitos países, principalmente nos que são contribuintes líquidos da União. Ou seja, os sinais que damos ao exterior não são os melhores. Por isso, Portugal terá de aproveitar, de uma vez por todas, esta ajuda externa para mudar de vida. Poderá não haver outra oportunidade. Pelo menos, na próxima década.
Nesse esforço colectivo, três questões são cruciais:
Havendo eleições a 5 de Junho, os partidos que concorrem têm de ser claros e apresentar, sem subterfúgios e disfarces, as medidas e propostas que têm para o país. Isso deve ser feito de forma séria e responsável, sem promessas de ilusões e sem programas vazios e vagos que tentam disfarçar o que realmente se defende para Portugal;
Os partidos políticos têm de ter a capacidade de criar entendimentos alargados de fundo que, de uma vez por todas, nos permitam “arrumar a casa” e iniciar uma nova fase. A luta político-partidária é importante e crucial para uma democracia com vitalidade. Mas, quando é levada ao extremo ou não é sustentada com propostas concretas que melhorem a vida dos portugueses, transforma-se num diálogo de surdos prejudicial para todos.
É tempo de tolerância zero com a irresponsabilidade. Todos os agentes políticos, nos diversos níveis de poder têm de dar o exemplo nas suas práticas, na forma como gerem os recursos públicos e na despesa pública que permitem. Cada cêntimo gasto tem de ser verdadeiramente bem gasto.
Infelizmente, esse esforço colectivo e a forma como o materializamos já não dependem apenas de nós. Dependem também de uma “Troika”, uma espécie de “Sr. Do Fraque” dos mercados financeiros.