Opinião

Simplesmente, Natal!

Natal é altura de relembrar histórias despretensiosas de outros passados, talvez menos fartos e consumistas… talvez mais ricos e solidários! Natais de família que reunia três gerações sob o mesmo teto, ao redor da mesma e ao som dos mesmos cânticos entoados em uníssono com vozes alegres e emocionadas. Natais do trigo verde viçoso e da alva ervilhaca nada e criada na escuridão do armário da cozinha. Natais das árvores de criptoméria decoradas com perfumadas tangerinas e rebuçados de açúcar, dos pavimentos das cozinhas cobertos de rama de pinheiro e paredes decoradas com cheirosos ramos de cedro. Natais das ceirinhas de figos passados, das alfarrobas, das farripas de laranja e dos chocolates “Regina”, comprados na Mercearia Jade. Natais das loucinhas da Vila, das carrocinhas de madeira e das bonecas de trapo ou de baquelite que transformavam o nosso mundo no país das maravilhas. Natais das peças de teatro da catequese da Irmã Teresa e do falecido Padre Artur- ainda há pouco relembrado -, da Missa do Galo, do beijar o Menino e de tantas outras tradições que centravam o Natal nos verdadeiros valores da fé cristã. Natais das visitas aos extraordinários presépios da fábrica do açúcar de Santa Clara, do álcool da Lagoa ou ao do senhor Prior da então Vila da Ribeira Grande, aonde o engenho e arte se aliavam à mecânica e à eletricidade e construíam movimentos inimagináveis que davam vida às figuras que os compunham e nos deixavam embasbacados e a explodir de felicidade. Natais em que, até os mais novos, com a aprovação dos progenitores, podiam saborear uns deliciosos licores caseiros de anis, maracujá, café, tangerina ou vinho abafado servidos em minúsculos cálices, popularmente designados de “calezinhos”. Natais em que os vizinhos eram aqueles amigos a quem se batia à porta e se perguntava, com a certeza de uma resposta afirmativa: - O menino mija? Natais de outros tempos… Caros Amigos – como é Natal, certamente me permitirão os assim tratar – quero lembrar esta época que, para crentes ou não crentes, inspirados no papel de Cristo na humanidade, deverá ser de reflexão acerca do nosso comportamento durante os longos 365 dias do ano no que respeita à solidariedade, à entreajuda e sobretudo ao respeito e atenção que nos devem sempre merecer todos quantos, muitas vezes dependem da nossa acção, seja ela direta ou indireta. Desejamos que esta não seja uma época apenas de consumismo, de desobriga moral e de caridadezinha mais ou menos indisfarçada. Que o Natal não sirva para propagandear ajudas privadas realizadas, para traze-las à pantalha, sem ética e moral, para se colocar em bicos de pés e exibir-se como exemplo a seguir a troco de um donativo que deveria ser anónimo e silencioso como o cair das neves numa montanha gelada. Neste natal de 2011, em que já muitos sofrem as consequências dos cortes salariais e do subsídio a que tinham direito e que o desemprego atingiu muitas famílias portuguesas, há que ser verdadeiramente solidário, sem hipocrisias e falsas caridadezinhas, mais do que exercer uma desobriga moral, dar o nosso contributo para a construção de uma sociedade mais justa e solidária. Que o Natal nos traga uma vivência de real paz, fraternidade, amor ao próximo e seja a verdadeira festa da família. De uma família solidária e alargada que abrace toda a Região, o país e o mundo. Boas Festas! Feliz Natal!