Ponta Delgada num próximo futuro debate-se com pelo menos três grandes desafios, que urge considerar de imediato para encurtarmos a distância entre o que podemos fazer hoje e o que será necessário fazer no futuro. Primeiro, como atrair pessoas para habitar a sua malha urbana mais antiga em casas confortáveis conforme exigências da vida moderna, tendo segurança e acesso a transportes, situação que demanda uma reabilitação de qualidade que, como se sabe, é muito dispendiosa para privados e público. Segundo, como manter as ruas e praças do seu núcleo mais histórico com dinâmicas comerciais, prestação de múltiplos serviços a residentes e turistas, onde tem de haver lugar para a cultura e animação. Terceiro, como manter à sua volta uma rede viária de transportes diversificados capazes de rapidamente fazerem aceder a esse núcleo milhares de pessoas para nele trabalharem, estudarem ou simplesmente dele fruírem.
Depois do seu massivo abandono nas últimas décadas, por parte da população mais jovem, quer para novas urbanizações na sua periferia, quer para zonas mais nobres das freguesias circunvizinhas, a malha urbana da cidade vive hoje o transe do vazio e tem tardado em encontrar soluções para cativar gente para morar com os mais velhos que cá ficaram ou vão ficando enquanto podem.
Ainda se chegou a pensar que seriam hordas de estudantes que viriam para cá frequentar a nossa universidade, que, necessitando de quartos e apartamentos demandariam grandes reabilitações das crescentemente degradadas moradias. A verdade é que esta solução não aconteceu. A academia não só não cresceu com o esperado número de alunos vindos de fora da ilha, nomeadamente do continente ou mesmo do estrangeiro, como ainda “regionalizou-se”, pois ficou com forte pendor de alunos naturais dos Açores e em particular de São Miguel, ou seja, gente que de uma forma ou de outra prescindiu de estadias, salvo em algumas moradias de qualidade nas ruas mais próximas do campus universitário.
Falhada a solução estudantes, de há quatro ou cinco anos a esta parte, a resposta para a reabilitação do parque habitacional degradado parecia passar pela adaptação das velhas moradias em alojamentos locais, hostels, residenciais, pequenos hotéis e afins, para acolhimento de turistas, mas, quando tudo parecia encaminhado nesse sentido, eis que nos surge a pandemia e os turistas interromperam a sua vinda e a esperada reabilitação/regeneração por esta via parece adiada.
Entretanto, e em plena crise de saúde pública, a cidade mergulha no abismo, onde é chocante ver a grande quantidade de casas a acentuar as suas degradações, nomeadamente nos pisos superiores, acompanhando o fecho de muitos espaços comerciais nos térreos, sendo, no entanto, justo dizer que para quem percorre algumas das ruas da cidade aqui ou ali já descortina muita informação de casas a aguardarem licenciamento para obras de conservação ou reabilitação.
Quanto à grave situação que o comércio tradicional vive hoje, é importante lembrar que a senda da sua degradação começa quando a cidade expande a sua habitação para as periferias e quando a norte surgem grandes espaços comerciais, concorrenciais em preços, produtos e conforto de compra. Para já, temos como certo, que se a situação pandémica não tiver inversão ou estancamento o nosso comércio tradicional dificilmente melhorará as suas dinâmicas.
Quanto ao ponto de situação da prestação de serviços, constata-se que os mesmos também têm vindo a deteriorar-se na zona mais histórica da cidade, bastando para tal ver como aos olhos de todos os bancos começam a eclipsar balcões ou mesmo simples caixas multibanco.
Em termos viários a cidade aguarda a construção de dois acessos fundamentais para o ordenamento do seu trânsito, a saber: a entrada nascente com a ligação da Avenida D. João III à Avenida João Bosco Mota Amaral, que terá rapidamente de avançar, com salvaguarda de todos os direitos de propriedade e outros adquiridos, enquanto a entrada poente com a ligação da rotunda sul de Santa Clara até à avenida marginal precisa também ser pensada, sabendo-se da propriedade e das especiais funções da antiga estrada do Estradinho, mas que de maneira alguma dispensa soluções a encontrar entre várias entidades, afinal, o futuro projeta-se, e mesmo que hoje não se possa construir tudo de uma só vez, é certo que a transformação daquela velha estrada em avenida litoral torna-se imprescindível para a requalificação urbana e funcional da zona e para ajudar a “cozer” a freguesia de Santa Clara ao centro histórico da cidade. Tanto em que pensar, tanto que fazer!