As últimas semanas, mais do que luz, trouxeram negrumes sobre os documentos de planeamento apresentados pelo Governo dos Açores para 2022.
Numa altura em que há países a impor novamente restrições, decorrentes da quinta vaga de COVID, em que já se sentem condicionalismos nas cadeias de abastecimento, em que se antecipa um agravamento generalizado dos preços, com mais do que certos reflexos nas taxas de juro, do Governo dos Açores nem uma palavra. Para este Governo, 2022, é mais um ano como qualquer outro, que o antecedeu e, portanto, aplicam a mesma receita.
Será que assumem que nada disto chegou ou chegará ao Açores? Ou, pior do que isso, que, chegando, logo se vê?!
É como se o mundo estivesse sobre Aviso Laranja e o Governo dos Açores, em vez assumir uma postura proativa, de recomendar à população que feche portas e janelas, desentupa os ralos e conduza com cautela, nos dissesse: Mantenham-se quietos. Tenhamos fé. Vamos ver se a tempestade passa!!!
As famílias e as empresas que se aguentem. O Governo vai sempre em frente, mesmo que a estrada tenha muitos cruzamentos, rotundas e até obstáculos de grande dimensão. O que interessa é chegar ao destino e o destino é 2024. Em primeiro lugar a sua sobrevivência e a manutenção do poder, o resto é "inflação" da oposição.
Nestas alturas em que se avizinham crises profundas, espera-se que um Governo esteja preparado, prepare as famílias e as empresas para a tempestade. Tenha um Plano A, Plano B e Plano C. Antecipe problemas e crie soluções. Mas não, o que temos é mais do mesmo, quando o cenário não é o mesmo.
Pior, temos mais do mesmo empolando receitas. E não estamos a falar de cêntimos. Falamos de 495 milhões de euros. Mais de metade daquilo que o Governo dos Açores planeia investir está assente em receitas que não vai ter e sabe que não vai ter.
É como se qualquer um de nós tivesse decidido comprar uma casa nova em 2022 que custasse100 mil euros, tivesse uma poupança de 30 mil euros e estivesse a contar com a herança de uma tia-avó (viva e de boa saúde) e com um empréstimo (que já sabia à partida que o banco não nos dá). Ou seja, não vai dar certo. Ou acabamos por não comprar a casa (e deixamos a família triste porque lhes criámos esta expectativa), ou não vamos pagá-la ao banco (e perdemos a credibilidade que nos resta).
Mas vamos a factos. De onde vem estes 495 milhões de euros?
Vem de mais endividamento (sem enquadramento legal), de uma imensidão de fundos comunitários (totalmente impossíveis de concretizar), de mais receitas fiscais (quando diminuímos impostos), do Orçamento de Estado (que não só não foi aprovado como nem a proposta os previa) e, para mim a pérola, dum saldo de gerência de 2021 (que só se apura depois das contas fechadas e, portanto, no início do próximo ano).
O Plano e o Orçamento de 2022 são as principais ferramentas deste Governo para enfrentar a crise. O problema é que não têm qualquer credibilidade, quando já sabemos, à partida, que a Região não disporá dos recursos para o colocar em execução.
Qualquer consideração que se teça, ou discussão, que se trave em relação às opções deste Governo, partirá sempre do total e cabal esclarecimento destes factos, coisa que até agora não aconteceu. Pior, a resposta que se conheceu foi qualquer coisa como: isto é assim, quem quer vota, quem não quer não vota, e, de vez, assume as suas responsabilidades.
Se para o Governo e para os partidos que o suportam é tudo uma questão de fé, a mim parece-me que sobra fé onde falta credibilidade.