O que se passa atualmente no mundo, com bombas a cair na Ucrânia, milhares de soldados a invadirem um país soberano e tanques russos às portas de Kiev, fez-me lembrar um célebre poema de Bertold Brecht. Reza assim: “Primeiro levaram os negros. Mas não me importei com isso. Eu não era negro. Em seguida levaram alguns operários. Mas não me importei com isso. Eu também não era operário. Depois prenderam os miseráveis. Mas eu não me importei com isso. Eu não sou miserável. Depois agarraram uns desempregados. Mas como tenho o meu emprego. Também não me importei. Agora levam-me a mim. Mas já é tarde. Como não me importei com ninguém. Ninguém se importa comigo.” O mundo, designadamente os Estados com poder efetivo de ação, sempre foi condescendente com o tirano Putin. Todos esses Estados sabiam do simulacro de democracia que é a Rússia. Todos esses Estados sabiam das perseguições e assassinatos perpetrados pelo regime totalitário de Putin a todos quantos ousassem opor-se ao grande líder. Todos esses Estados conheciam as ameaças feitas ao longos de anos e anos pelo ditador Putin. Todos esses Estados conheciam, e pactuaram, com o galopante engrandecimento do poderio militar da Rússia. Todos esses Estados sabiam das ambições imperialistas do déspota Putin. Todos esses Estados sabiam que Putin considera a desagregação da União Soviética (1991) a maior tragédia geopolítica do século XX. Todos esses Estados viram o que aconteceu, em 2008, na invasão à Geórgia (pátria de Estaline). Nessa altura Putin até nem era Presidente. Era primeiro-ministro, mas mandava no fantoche (Medveded) por si escolhido para ser temporariamente Presidente. Todos esses Estados assistiram, em 2014, à “anexação” da Crimeia. Todos esses Estados sabem, desde a chegada ao poder do tirano Putin, que este estava disponível a tudo (tudo, mesmo!) fazer para tornar Moscovo dono e senhor das repúblicas saídas da União Soviética. Com exceção dos países bálticos. E sabem porquê? As repúblicas bálticas da Estónia, Letónia e Lituânia são membros da UE e da NATO desde 2004. O tirano russo sabe o que lhe acontecerá no dia que invadir um país da NATO. E é aqui que os tais Estados falham e deixam o restante mundo indignado e de lágrimas nos olhos ao ver o que se está a passar na Ucrânia. O povo e território ucraniano foi deixado à sua sorte. Os Estados com poder de ação andam a brincar há longos anos às sanções à Rússia. Putin sempre andou à vontade pelo mundo. Os tais Estados, conhecedores de tudo, até o recebiam com solenidade e deferência. A tónica dominante no pensamento dos representantes destes Estados sempre esteve no facto da Rússia ser o segundo maior produtor de gás natural e uma das maiores produtoras de petróleo do mundo. Será que mais este ato criminoso do ditador Putin mudou mentalidades? Será que os tais Estados vão começar verdadeiramente a importar-se? Ou o massacre ao povo ucraniano não será ainda suficiente? Esperemos que a reação não seja demasiado tarde…