Versão integral da intervenção do presidente do Governo, Carlos César, na abertura, hoje em Ponta Delgada, de uma mesa redonda sobre Pobreza e Exclusão, promovida no âmbito da Presidência Portuguesa da União Europeia:
"Em nome do Governo dos Açores e em meu nome pessoal dou as boas-vindas a todos os participantes desta VI Mesa Redonda Europeia sobre a Pobreza e a Exclusão Social.
É para nós muito significativo e honroso que esta reflexão ? este ano feita em torno de conceitos como mínimos sociais, inclusão activa, protecção e empowerment ? decorra numa Região onde, ao longo dos últimos anos, a luta contra a pobreza e a favor da inclusão tem sido um dos pilares bem sucedidos do nosso modelo de desenvolvimento e, por isso, uma componente de relevo das nossas políticas públicas.
Nos Açores, face à natureza geográfica de arquipélago e à distancia do continente europeu, bem como ao facto de cada uma das nove ilhas apresentar potencialidades e problemáticas próprias, as politicas de promoção da coesão social e territorial assumem uma ponderação determinante na efectivação da igualdade de direitos e de oportunidades.
Demasiado tempo viradas para si mesmas, algumas das nossas ilhas, particularmente as mais frágeis, são alvos agora da criação de condições que fomentam uma atitude colectiva de empreendorismo social e económico, que promovem a inovação ao nível das organizações locais, dinamizando projectos que proporcionam, simultaneamente, a sua sustentabilidade autónoma e a sua integração no mercado regional e em dimensões mais vastas.
O Governo dos Açores definiu um plano de acção assente em estratégias de intervenção social activas que se materializam, por um lado, na realização de projectos que combinam a solidariedade e a inserção pelo económico, sustentados pelo alargamento permanente dos equipamentos de apoio às crianças em risco, às famílias e às pessoas com maior dependência, e, por outro lado, na constante adaptação às novas problemáticas que têm surgido nos Açores, principalmente no que diz respeito às alterações das estruturas familiares, ao repatriamento, aos sem abrigo, à imigração, às toxicodependências, à violência doméstica e aos jovens em risco.
Estes problemas ganham, principalmente nas ilhas mais pequenas, potenciais de estigmatização, sendo que a descontinuidade territorial dificulta, nestes como em todos os domínios, uma resolução mais integrada e facilitada.
Estas situações têm vindo a implicar um processo de reorientação da intervenção social do Governo dos Açores e de transformação da rede de equipamentos sociais, diferenciando-os e tornando-os capazes, em todas as ilhas, de acolher todos os cidadãos, em função das suas diferentes necessidades, assegurando a realização dos seus direitos e, ao mesmo tempo, a criação de oportunidades para a sua inserção na comunidade, mediante a promoção das suas competências e capacitação para a autonomia.
Trata-se, assim, de consagrar e implementar padrões sociais mínimos, nomeadamente de subsistência, sob forma de rendimento mínimo garantido, trabalhando a aquisição de competências pessoais, sociais e de empregabilidade que inculcam a condição de cidadania.
Desde 2002, e paralelamente ao contínuo aumento dos equipamentos sociais e ao reforço da sua capacidade, as políticas sociais nos Açores têm vindo a direccionar-se para a clarificação e reconhecimento operacional da natureza diversificada, complexa e multidimensional da pobreza e da exclusão, exigindo a concepção de metodologias de intervenção social integradas, sistémicas e transversais aos diversos domínios culturais e sócio comunitários.
Foi nesse contexto que surgiu, como processo prioritário, a criação de um Sistema de Planeamento Territorial Estratégico. Este processo assenta numa nova matriz de princípios de intervenção interligando: o Desenvolvimento Local e a Territorialidade, a Inserção e a Inclusão; a Diferenciação e a Especialização; a Parceria e a Articulação Institucional; e o Conhecimento e as Metodologias de Intervenção na Comunidade.
A presença de medidas de combate à pobreza e exclusão, em praticamente todas as áreas de acção do Governo dos Açores ? desde a educação até à economia, passando pela habitação, formação profissional, emprego, juventude, saúde e novas tecnologias ? irá continuar a ser, assim, a nossa principal missão, desenvolvida em cooperação com as associações locais e instituições particulares de solidariedade social dos Açores.
São disso exemplos os projectos de Intervenção Específica em Rabo de Peixe, Itineris- Aprendizagem Global para Jovens em Risco, Micro-crédito, Observatório Sócio-Habitacional dos Açores, Rede Regional de Cuidados Continuados Integrados, PROJUS e o Movimento de Economia Solidária, entre outros.
A nova matriz de intervenção adoptada pelo Governo dos Açores traduziu-se na definição de novos objectivos e novas metodologias de trabalho, de que resultaram importantes acções. Destaco os cinco vectores seguintes:
1º A definição de uma "Política Social Descentralizada e Territorializada" que privilegia respostas concertadas, coordenadas e orientadas para as soluções e não para os problemas. Estas visam a promoção contínua de projectos locais (em cada ilha) de prevenção e combate à pobreza e à exclusão inseridos na Rede de Centros de Economia Solidária que agrega empresas de inserção, serviços de apoio de proximidade e formação em trabalho a favor da comunidade, como plataforma de suporte à execução dos programas do Rendimento Social de Inserção;
2º O aprofundamento de uma "Intervenção Social Integrada" que interliga acções vocacionadas para o aumento das capacidades e competências de inserção na comunidade por parte dos indivíduos, o reequilíbrio dos seus laços sócio-familiares e o fortalecimento dos processos de socialização das famílias;
3º A reorganização da capacidade de intervenção do sistema de Solidariedade e Segurança Social dos Açores na resposta a problemáticas que exigem a diferenciação de metodologias e de instrumentos, através de uma estratégia de "Intervenção Social Especializada", realizada por cerca de 40 "Equipas Técnicas Multidisciplinares" que actuam face a situações especiais de risco e na reabilitação de grupos sociais de grande vulnerabilidade;
4º A clarificação da "Gestão da Intervenção Social" nas diferentes ilhas da Região, fortalecendo o trabalho em "Rede de Intervenção Diferenciada" e procurando a eficiência e a eficácia das respostas sociais dirigidas a grupos específicos, mediante o planeamento partilhado das intervenções e a racionalização dos recursos técnicos e logísticos. Na nossa Região estão já em pleno funcionamento cinco Redes de Intervenção Cooperada, dois Centros de Recursos de Apoio Integrado e uma Agência de Interligação de Serviços e Instituições, nas quais participam mais de 120 entidades privadas e públicas;
Finalmente, um 5º vector: A implementação de um modelo operacional diferenciado ? o "Sistema de Gestão de Conhecimento na Intervenção Social". Criámos, no âmbito deste sistema, o "Centro de Formação e Observação Social", estrutura base fundamental de formação e da investigação-acção, os "Centros de Formação e Acompanhamento Técnico" das competências dos profissionais dos serviços de proximidade, os "Centros de Formação de Competências Pessoais, Sociais e de Empregabilidade", e as "Oficinas de Desenvolvimento de Instrumentos e de Metodologias".
Em síntese, a procura de um modelo de desenvolvimento de políticas públicas sociais em regiões insulares arquipelágicas e ultraperiféricas, como é o caso dos Açores, deve contemplar uma intervenção que assente na valorização das competências individuais e colectivas das populações das diferentes ilhas, não descurando a criação de valor económico, contribuindo para a preservação de valores e recursos naturais e procurando um impacto efectivo e duradouro nas condições de vida e bem estar.
Creio, aliás, que seria interessante e oportuno, partindo da análise da matriz de intervenção social nos Açores, bem como de outras experiências, promover a criação de uma Iniciativa Comunitária de Desenvolvimento Social e Local para as Regiões Ultraperiféricas que incorpore a perspectiva de uma Solidariedade que promova a Economia (garantindo padrões sociais mínimos que sustentem os processos de integração sócio-profissional), de uma Economia Solidária que fomente a produção, crie emprego para as pessoas em risco de exclusão, gerando rendimentos e contribuindo para a satisfação de necessidades locais.
Os constrangimentos muito próprios que afectam as regiões ultraperiféricas justificam e exigem, na nossa opinião, uma resposta específica, no âmbito da acção da União Europeia, no combate à pobreza e à exclusão social. Penso que foi essa a motivação primeira da iniciativa da Presidência Portuguesa da União ao realizar nos Açores este evento.
Desejo os maiores sucessos nos vossos trabalhos".
GaCS/AP/PGR