Catarina Moniz Furtado apresentou esta quarta-feira à Assembleia Legislativa dos Açores, em nome do PS/Açores, o seguinte voto de pesar, aprovado por unanimidade, que se transcreve na íntegra:
VOTO DE PESAR
GRAÇA COSTA CABRAL
Gostava de chegar à Quinta de S. Miguel e ser recebida pelas rosas, logo à entrada do Ar.Co em Almada. Morreu a 21 de janeiro em Lisboa, a escultora açoriana Graça Costa Cabral.
Maria da Graça Andrade Albuquerque Silva foi a segunda filha de uma família onde a imaginação não faltava. O pai era um empresário inventor e a mãe uma criativa de tapeçarias e móveis.
Nascida em S. Miguel, em 1939, cedo soube o que pretendia fazer: partiu para o Continente para estudar. Fez o liceu já em Lisboa, na escola António Arroio e licenciou-se em Escultura na Escola Superior de Belas Artes, onde conheceu o pintor Manuel Costa Cabral, com quem casou e viveu.
Foi sempre uma opositora ao regime fascista e, como afirma o marido, “não teve outra militância que não a cultural”. Em 1973, já com duas filhas e um filho, Graça Costa Cabral e Manuel Costa Cabral fundaram o Ar.Co – centro de arte e comunicação visual - para ser, sob o signo da Liberdade, uma escola de arte independente dedicando-se à experimentação em várias áreas como a pintura, a escultura, o desenho, a fotografia e a cerâmica.
Dividia o seu tempo entre as actividades no Ar.Co – que tendo começado por ser uma sociedade de quotas é atualmente uma associação sem fins lucrativos com estatuto de utilidade pública - e o seu ateliê, sem nunca perder a ligação aos Açores. Para além de vir frequentemente aos Açores, em Lisboa não deixava acabar o stock do doce de capucho (tipicamente nosso) e manifestava saudades da ilha quando suspirava pelo sabor a ananás.
Segundo o marido: “Graça gostava de experimentar novos materiais, novas técnicas. Usou madeira, a pedra, o bronze, o vidro, o cristal, a prata, a porcelana que “adorava””. As suas peças estiveram em inúmeras exposições individuais e colectivas em Portugal e no estrangeiro ao longo de 30 anos.
A sua obra está tão representada no Santuário de Fátima – onde se destaca a escultura de Nossa Senhora Mãe do Bom Pastor, o monumento evocativo dos padres Manuel Nunes Formigão e Luís Fischer e as figuras dos Beatos Francisco e Jacinta Marto – que o diretor do museu do Santuário, Marco Daniel Duarte, realçou o papel de Graça Costa Cabral na valorização da arte sacra contemporânea. A artista era profundamente católica e isso também influenciou a sua obra, como fica expresso no seu icónico presépio em prata da Fundação Calouste Gulbenkian, do qual foi oferecido um exemplar reduzido ao Papa João Paulo II na sua visita a Portugal.
Marcas da sua ligação e presença regular nos Açores são as obras da artista presentes na região, quer em coleccionadores privados, como é o caso da obra Folha, peça em bronze, que integra o acervo do Centro Cultural da Caloura, quer representada em instituições públicas com Objetos de Culto, cinco peças em ferro e porcelana, que integram o acervo do Arquipélago – Centro de Artes Contemporâneas dos Açores.
A propósito dos seus Objetos de Culto, Graça Costa Cabral escreveu: “Os objectos de culto pertencem ao mundo das formas. Não deixando de ser aquilo que são, a eles se sobrepõe outra qualidade; a presença de outras dimensões invisíveis e subtis unificadoras do universo. São objectos que assinalam a ligação entre o reconhecido e o mistério. Formas abertas para receber matéria transmutada ou formas fechadas, densas, pressupondo o segredo dentro, a essência do indizível, o divino velado. A persistência dessas formas ao longo dos séculos e civilizações faz-nos reconhecê-las quando vistas. Parece haver um vocabulário, uma linguagem específica que as faz aparecer, como se o processo fosse inverso, elas próprias condutoras da mão do homem. Estas esculturas foram construídas como quem encontra, um exercício de meditação tendo presente um vocabulário formal significativo de noções do receber, do conter e também do movimento consequente, o oferecer. Se o primeiro movimento do homem é receber, dar é o primeiro movimento do Criador. Estas esculturas não são objectos de culto em si, referem mais do que tudo o meu espanto dessa necessidade intrínseca ao homem de materializar, marcar um ponto de presença onde todo o universo criado e o seu Criador São.”
Assim, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ao abrigo das disposições regimentais aplicáveis, propõe à Assembleia Legislativa Região Autónoma dos Açores a aprovação do seguinte Voto de Pesar:
A Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, reunida em sessão plenária no dia 16 de março de 2016, lamenta a morte de Graça Costa Cabral e endereça voto de pesar à família enlutada.
Do presente Voto de Pesar deve ser dado conhecimento à família, na pessoa do pintor Manuel Costa Cabral e ao Ar.Co – centro de arte e comunicação visual.