Como recentemente foi escrito, neste mesmo jornal, pelo meu bom amigo Pedro Gomes, o debate da Conta da Região, ou seja, a apreciação da despesa pública regional, “não pode eximir-se ao debate, sereno e sem crispação, sobre o endividamento público regional, considerando a dívida direta, a financeira, administrativa, comercial, bem como as responsabilidades futuras”. Aceitando estas premissas como válidas para uma discussão que importa fazer, diga-se, em abono da verdade, que o ex-deputado Pedro Gomes procurou, apesar de eu discordar de algumas das suas conclusões e argumentos, estabelecer um nível superior de discussão que infelizmente ele não viu nem eu encontrei na nossa oposição parlamentar.
A propósito da situação das finanças públicas regionais recordemos então alguns dados que não se podem perder nessa discussão:
PRIMEIRO - O défice orçamental na Região em 2012, utilizando os mesmos critérios de avaliação do país (utilizados pelo INE, Eurostat, Comissão Europeia, FMI e Banco Central Europeu), foi de 0,4% do PIB regional enquanto o do país foi de 6,6%.
SEGUNDO - O endividamento líquido da Região diminuiu 87,7 milhões, enquanto o do país aumentou.
TERCEIRO - A dívida pública regional neste ano foi de 723 milhões de euros, "correspondendo a 18% do PIB dos Açores", quando a nível nacional foi de 124% do PIB do país e na Madeira foi de 78% do seu PIB.
Alguma oposição criticou o facto de, no ano de 2012, o Sector Público Regional ter aumentado o seu endividamento em 17 milhões de euros, tendo, inclusive, dito que este se encontrava “falido”.
Qualquer cidadão percebe que, nestes anos de crise, sobretudo em 2012 e em 2013, quando a crise incidiu com particular força nos Açores, empresas que prestam um serviço público ou que foram compradas porque a sua falência poderia afetar seriamente a economia de algumas ilhas, tivessem maior probabilidade de apresentar prejuízos.
Mas, de facto, considerando os dados apresentados, isso poderia não ter acontecido; poderiam até ter diminuído o seu endividamento se, para isso, o Governo da República tivesse pago o que devia às empresas públicas regionais - cerca de 120 milhões de euros! Mesmo assim o peso da dívida do SPER face ao PIB é comparativamente menor ao nacional também.
Tudo isto é curioso, pois sobre estes factos nunca ouvi uma única palavra da oposição parlamentar nem de nenhum presidente de corporação.
Continuando a analisar a situação das finanças públicas regionais menciono, de novo, o artigo do ex-deputado Pedro Gomes, que refere a uma determinada altura que “a dívida pública e os compromissos futuros atingem o montante total de 3,4 mil milhões de euros, como evidencia o parecer do Tribunal de Contas sobre a Conta da Região de 2012.”
De facto, o Tribunal de Contas, na sua análise à Conta, menciona os valores da Dívida Bancária da Região, dos Compromissos Assumidos pela Região (com o SPER, fornecedores e com autarquias), dos Avales e, de um conceito de “Obrigações Contratualizadas”, único no País, pois nem o TC da Madeira, nem o do Continente o consideram nos seus relatórios.
Como princípio base na análise destas rubricas importa, desde já, esclarecer que estas não podem ser somadas, tal como o Tribunal de Contas sustenta quando afirma que “nunca o fez”. Aliás, ao somar estas rubricas incorreríamos num erro grosseiro, seria como considerar a dívida de uma casa ao banco duas vezes: a do dono porque contraiu a dívida, a do fiador porque a avalizou. Como facilmente se percebe só há uma dívida e esta só pode ser paga uma vez.
Ora, mesmo incorrendo neste erro, para conseguirmos chegar perto dos tais “3,4 mil milhões de euros”, referidos pelo ex-deputado Pedro Gomes, teríamos que efetuar a soma de 659,5 milhões de euros (dívida bancaria e compromissos assumidos) mais 1436 milhões (obrigações contratualizadas) e mais 458 milhões (avales). Mesmo assim obteríamos 2553,77 milhões de euros, ou seja, menos cerca de 800 milhões de euros do que o valor referido.
O que também não menciona Pedro Gomes e a oposição parlamentar é que os encargos previstos com as Parcerias Público-Privadas pelo Tribunal de Contas, de 2011 para 2012, sofrem uma redução de cerca de 501,4 milhões de euros.
Com estes dados não quero dizer que as contas públicas regionais sejam um mar de rosas, porque, de facto, não o são – há dificuldades em vários sectores afetados pela crise, sobretudo ao nível da saúde – mas devemos sempre analisar a nossa situação no contexto em que estamos inseridos.
Se a direita política considera uma vitória o défice orçamental do Estado estar, em 2013, perto dos 5%, porque não diz o mesmo quando nos Açores este é de 0,2%?
Porque é que quando a Comissão Europeia elogia o Governo da República, o PSD e o CDS/PP rejubilam de alegria, mas quando faz o mesmo aos Açores é porque “desconhecem a realidade insular”?
Nesta discussão, em coerência, devemos ter bom senso e considerarmos boas notícias os bons resultados obtidos isolada como comparativamente considerados. É assim, sem omissão de toda a verdade útil e reveladora, que estaremos mais aptos para avaliarmos tudo o que temos que continuar a fazer para ultrapassarmos a crise, ajudarmos as empresas e assegurarmos o futuro nas nossas famílias.