Opinião

A palavra do ano

Mais uma vez foi votada a “palavra do ano”, iniciativa promovida anualmente pela Porto Editora. Parece impossível condensar numa só palavra 365 dias e os milhares de acontecimentos que neles se desenrolaram. No entanto, a votação já se tornou um hábito e é sempre interessante ver a que vocábulo os portugueses reduzem todo um massivo espaço temporal. Aparentemente, a “palavra do ano” de 2015 é “refugiado”. E é sintomática. Os portugueses têm demonstrado, ao longo dos anos, uma tendência para eleger palavras de pendor negativo (com uma exceção ou outra), ou não estivéssemos nós consecutivamente em lugares “menos que cimeiros” nos rankings dos países mais felizes do mundo. Em 2010, no meio de candidatas como “défice”, “desemprego”, “FMI”, “orçamento” ou “PEC”, os portugueses elegeram “vuvuzela”. Em 2011, de entre palavras como “esperança”, “sushi” ou “voluntariado”, a escolhida foi “austeridade”.Em 2014, foi escolhida a palavra “corrupção”, suplantando pérolas como “selfie”, “basqueiro”, “cibervadiagem” ou, lá escondidinho, “jihadismo”. Conclusões propriamente ditas, só as mais óbvias. Por um lado, que os portugueses, confrontados com uma situação económico-financeira preocupante no país, lembram-se mais daquilo que os incomodou ao ver a bola. Por outro, que para os portugueses qualquer coisa é melhor que peixe cru. E que nem o terrorismo lhes faz mais espécie do que alguém corrupto. Ao menos este ano, pareceu-me uma escolha adequada. Não há como fugir, efetivamente ao drama que se desenrola ainda hoje, fruto de conflitos armados que causaram um sério colapso social, e cujo preço ainda está por determinar. É impossível não relembrar as trágicas imagens diárias com que nos deparamos quase todos os dias. Por isso, creio que este ano os portugueses escolheram uma palavra que diz muito de nós próprios. Diz do querer ser solidário, do querer prestar auxílio, do sofrer só por ver o que o nosso próximo está a passar. Mas a palavra “refugiado” representa muito mais que esses milhares de pessoas que fogem em busca de algo melhor. Encerra em si o fantasma do terrorismo, do horror dos atentados de Paris, de Beirute, do Charlie Hebdo, da Universidade de Garissa, do Kuwait, da própria Síria, de tantos e tantos outros que quase nem receberam tratamento mediático. Mas urge que, este ano, a palavra de ordem seja “Paz”. Para que os Homens se entendam. Para que se renovem. Para que aproveitem melhor os dias e promovam o entendimento e a concórdia. A paz para poder votar quem nos governe a um caminho alumiado pelo bem comum, pela honestidade e pela correção e à força necessária para continuar um trabalho que, apesar de árduo, acarreta o objetivo da concretização da felicidade e realização de quem é governado. Que sejamos mais e melhores que aquilo que somos. Que ajudemos o próximo a sê-lo também. Que não cedamos à crítica fácil e mesquinha mas que trabalhemos para uma verdadeira mudança. Que sejamos mais que palavras escritas nas redes sociais, vociferadas por detrás de ecrãs muitas vezes promotores de discórdias desnecessárias, movidas a fel. 2016 será um ano de desafios, a todos os níveis. Quero acreditar que, com esperança renovada, novos contextos e mais espaço para respirar, os portugueses poderão, finalmente, começar a escolher palavras mais positivas. Que sejamos mais que uma palavra só. Sejamos muitas. As boas. Um bom ano a todos.