Eu devia escrever uma prosa prezada sobre as virtudes natalícias, em que lamentasse o vermelho capitalista do Pai Natal, em detrimento da idade de ouro, em que era só presépios com ovelhinhas e pastorinhos, pobres mas honestos, com “leivas” dos nossos pastos; eu devia lembrar as virtudes mais ou menos monásticas do “ser” sobre o “ter”; eu devia criticar a tentação do “materialismo” (dialético?), em detrimento da pobreza purificadora. Poder, podia. Mas não me apetece!
Desde logo, porque outros já se encarregaram desse nobre encargo, e eu quero evitar o risco da sobredose. Mas fiquei confuso… É que, afora esta quadra, e no mundo peculiar dos nossos media, só vejo “gordas” a falar de pobreza. Alguma oposição, sobretudo a que teve responsabilidades governativas, descobriu zelotamente o fenómeno. E fala dele como se fosse coisa recente, a ter começado aí em fins de 96…
É claro que sabemos todos a “abastança” que tínhamos ante-96: uma escolarização e alfabetização que espantava a Europa; uma taxa de mortalidade infantil que batia recordes e nos irmanava com os verdadeiramente pobres deste mundo; um PIB per capita de arregalar o olho; um Serviço de Estatística que “escrutinava” pormenorizadamente essa realidade; listas de espera na Saúde não havia (E não havia mesmo, porque não se faziam!); uma economia privada independente e pujante, em que os gerentes do BCA eram nomeados nas sedes do PPD; a harmonia de desenvolvimento entre as ilhas, de que a “zona fraca” de Santa Maria é um exemplo afortunado. E que saudades dos tempos, por falar em “asfixia” da sociedade, em que a Segurança Social tinha um cacique em cada Casa do Povo?...
Eu quero uma “play-station” em cada habitação social e os meus conterrâneos a viajarem barato na hoje tão criticada acessibilidade aérea com Lisboa/Porto! Como diz o brasileiro: “quem gosta de pobreza é “intelectual” …