Opinião

Apareça por cá. Pode ser que seja vacinado…

Nos últimos dias temos assistido, em São Miguel, a um total desnorte na gestão do processo em curso de vacinação contra a covid-19. Sucedem-se as notícias e reportagens que nos deviam envergonhar a todos. A vacinação entrou numa espécie de registo tipo “bar aberto”. É chegar, esperar um pouco, e está feito. Não, infelizmente, não estou a exagerar ou a caricaturar com demasiado sarcasmo. À data que escrevo, para dar uma correta noção da realidade, o Diário Insular traz em manchete, com uma foto das Portas da Cidade, o seguinte título: “Vacinação sem critérios gera caos em São Miguel”. Ora, se o título já nos deixava arrepiados, o que dizer do respetivo desenvolvimento? Na página 13, é referido, com o título “Vacinação combinada entre amigos deixa São Miguel em alvoroço”, o seguinte destaque: “Contra todas as regras, cidadãos de São Miguel passam palavra uns aos outros e são vacinados nas Portas do Mar sem marcação. A ilha levanta-se em protesto”. O Diário Insular publica, inclusivamente, diversos testemunhos de cidadãos que, sem marcação prévia ou qualquer critério clínico, foram vacinados até ao fim do dia 25 de abril. Esta “janela de oportunidade”, ancorada num despudorado amiguismo, é uma afronta a todos os cidadãos integrantes de grupos de risco, com comorbidades associadas ou com idade avançada, os quais, supostamente, estavam numa lista de prioridade (?) para efeitos de vacinação. A Câmara de Comércio e Indústria de Ponta Delgada foi uma das instituições que já exigiram publicamente explicações. O Governo, à hora que escrevo, acabou de dar nota pública que “tendo em conta denúncias chegadas à Secretaria Regional da Saúde e Desporto, e outras levantadas nas redes sociais, sobre a alegada vacinação abusiva contra a covid-19 no passado fim de semana, no Centro de Vacinação da Unidade de Saúde de Ilha de São Miguel, nas Portas do Mar, em Ponta Delgada, o secretário Regional da Saúde e Desporto determinou a abertura de processos disciplinares e de um inquérito”. Acrescentando-se, nos termos da referida nota, que “a investigação visa o cabal apuramento dos factos objeto de denúncia, bem como os respetivos responsáveis”. Assim se espera. E, já agora, com a máxima celeridade. A defesa da saúde publica não pode reger-se pela discriminação e o livre arbítrio inerente a amiguismos e compadrios. Está em causa, para além da saúde pública, uma imprescindível paz social que é fundamental para a sociedade ultrapassar, sem quaisquer “alvoroços”, esta terrível pandemia. A ideia de que isto é mais fácil para os tipos desenrascados ou os “fura filas” não pode vingar. Este é um dos assuntos que exigem total transparência, critérios imaculados e uma lisura irrepreensível nos procedimentos. Bem sei que, infelizmente, a realidade tem sido muito diferente do que refiro. Já tivemos o “caso das vacinações indevidas” em diversas instituições, o qual ainda se aguarda pela apresentação pública do resultado das inspeções realizadas. Agora temos um “take II” de vacinações indevidas, o que virá a seguir? É que o processo de vacinação está ainda com pouco mais de 10% de cobertura nos Açores (considerando-se a toma das duas doses). Falta, por isso, um longo caminho…Exige-se, em nome dos maiores elementares princípios, menos gargalhadas e muito mais responsabilidade!