Opinião

aula aberta ao fascista infante

caro fascista infante,

para começar esta aula aberta, deixa-me dizer-te que não é correcto usar o termo "fascista" para caracterizar o antro de oportunismo que enche os teus dentes amarelos de mentiras e que ofusca os teus olhos engarrafados de enganos. é difícil usar um adjectivo que, apesar de pesado e de má memória, pressupõe um determinado nível de inteligência por parte do seu adjectivado e uma adesão coerente e completa à causa por parte do seu partido - algo que escasseia em ambos.

de uma forma genérica, pode descrever-se o fascismo como uma ideologia política ultranacionalista e autoritária caracterizada por: poder ditatorial, repressão da oposição por via da força, desprezo pela democracia eleitoral e pela liberdade política, crença numa hierarquia social natural e numa comunidade em que os interesses do indivíduo são subordinados aos interesses da nação.

são estes os grandes pilares da ideologia fascista em geral, da qual o partido chega é uma parte, mas não um todo, e do qual tu, infante, és membro e representante. portanto, qualquer pessoa que descreva o chega como um partido com tendências fascistas ou, numa benevolência intelectual, apenas de fascista, não estará a fazer mais do que constatar um facto. 

sei que te vai custar entender isto, mas o papel da educação - aquela que pretendíeis privatizar há tão pouco tempo - é precisamente explicar as múltiplas realidades do nosso mundo aos jovens em idade escolar. para que aprendam e apreendam.

sei também que não vai ser fácil perceberes isto, mas já tive oportunidade de escrever muitas linhas sobre este assunto: a liberdade de expressão deve ser completa. não sem consequências, mas completa. caso contrário, não será nunca liberdade, mas sempre uma coordenada adversativa. querer reprimir a liberdade do outro é uma característica fascista e o requerimento que assinaste é apenas mais um exemplo de tentativa de repressão da liberdade, em formato "queixinhas".

o teu partido defende o lema "deus, pátria, família e trabalho". um lema composto, nos seus três primeiros quartos, por uma clara alusão à memória do fascista salazar e do seu estado novo fascista. não contente com esta directa referência, o último quarto é tão somente um piscar de olhos à célebre frase "o trabalho liberta", que se podia ler à entrada dos campos de concentração nazis, durante a ii guerra mundial.

dúvidas houvesse sobre a referência velada a gente de má memória, convém lembrar-te que o teu actual querido líder pregou durante a sua campanha eleitoral a intenção de instalar em portugal uma quarta república, à semelhança do terceiro reich alemão de hitler - ecos do fascismo na europa dos nossos dias.

claro que vais dizer que não era para levar a sério. que no fundo era só para ganhar votos, tal como quando vociferou contra a educação pública e agora se instala parasiticamente na luta dos professores, qual carrapato ou carraça no dorso peludo de um animal. são homens sem palavra, infante, homens sem honra e sem espinha dorsal. assim, como tu.

pese embora "estado novo" e "terceiro reich" não sejam realidades das quais a tua memória tenha referentes empíricos, ou a pele sentimentos recentes, é extremamente importante que não te esqueças dos horrores do fascismo na europa e, para isso, temos a escola pública que nos lembra o poder do passado na expressão do presente.

"who controls the past now controls the future (...)who controls the presente now controls the past" resume em boa verdade a intenção do ficcional ministério da verdade em reescrever a história dos cidadãos de oceania, na obra de georgeorwell, o que era algo que permitiria controlar as massas. e todos nós sabemos que o controlo das massas é um objectivo fascista, infante.

o teu partido ostraciza os ciganos e todos aqueles que são diferentes, física e intelectualmente, de um estereótipo que vocês criaram para efeitos de ódio. pomposamente, o teu querido líder combate todos aqueles que não são "pessoas de bem" ou não são "verdadeiros portugueses".

sobre isto recordemos as palavras de hitler: "nunca deve ser esquecido que a finalidade suprema da existência dos homens não é a manutenção de um estado mas a conservação da sua raça. quando a raça corre o perigo de ser oprimida ou eliminada, a questão da legalidade passa para segundo plano". (mein kampf, p. 78).

ou ainda: "o mundo não se fez para povos cobardes" (p.79) e "os direitos do cidadão estão acima dos do estrangeiro (...) o homem sem honra ou sem carácter, o criminoso de direito comum, o traidor à pátria, etc. podem em qualquer altura ser privados dessa dignidade." (p. 347).

sobre a repressão da opinião contrária: "a alma das massas não é sensível senão ao que é inteiro e forte. tal como a mulher, pouco dada a raciocínios abstractos, que experimenta uma indelével aspiração sentimental por uma atitude íntegra e se submete ao forte e domina o fraco, a massa prefere o que domina e não o que implora. sente-se mais satisfeita com uma doutrina intransigente que não admite concorrência que com uma tolerância liberal. (p.39).

resumindo, meu querido infante, são por demais as parecenças do chega com o fascismo para te esconderes atrás da pretensa liberdade de expressão que evocas. a qual, ironicamente, é a mesma que te permite exprimir algumas das alarvidades que já exprimiste e que continuarás a exprimir porque és livre para tal.

um bem-haja à professora de são jorge "devidamente identificada" pelo teu partido, por ter esclarecido os seus alunos sobre a proximidade entre o chega e a ideologia fascista.

presto a minha homenagem a todos os professores e professoras, cidadãos e cidadãs, pais, mães, e restantes agentes educativos que investem o seu tempo a educar os nossos jovens e a não deixá-los embarcar nos enganos e frases fáceis que o chega tão habilmente gosta de apregoar.

um professor tem mais legitimidade e moralidade para explicar a uma criança que a repressão das ideias contrárias é um erro do que tu, infante fascista, tens legitimidade para requereres quaisquer penalizações sobre quem pensa diferente de ti. especialmente quando pensar diferente de ti é falar a verdade.

portanto, para concluir a aula de hoje, infante fascista: por vezes, não basta ter a aparência de homem. é preciso ser-se homem do bem. e ser-se homem do bem também passa por aceitar com dignidade as consequências das nossas ideias e deixar de fazer queixinhas ao papá de todas as vezes que alguém fala mal de nós no recreio.

é que depois ninguém quer brincar contigo.