Opinião

Casa precisa-se (ainda)

A 28 de abril de 2023, escrevia a crónica “Casa precisa-se”, dando conta da enorme dificuldade que se fazia sentir no acesso à habitação: “(…) perante um agravamento galopante da situação, a capacidade de resposta das entidades públicas, com responsabilidade na matéria, torna-se não só insuficiente como, muitas vezes, cruel”. O que mudou desde então?
Passados quase 17 meses, tudo na mesma (é, exatamente, o que estão a pensar). Um governo que anuncia, repetidamente, a construção ou recuperação de habitações tendo ao seu dispor, desde 2021, 60 milhões de euros só para a habitação. E o mais grave é que tendo os meios financeiros para concretizar, ousa responder às famílias que continua com indisponibilidade de habitações, pedindo que aguardem um contacto do serviço, coisa que, para a esmagadora maioria, jamais acontece!
Em abril, o CESA alertou para o incumprimento de marcos do PRR na área da Habitação, mencionando as 101 habitações que deveriam estar reabilitadas em dezembro de 2023, o que não se concretizou. Apontou, ainda, o baixo nível de execução financeira do PRR, inferior a 20%. Uma dupla chamada de atenção: urgência em aumentar a resposta habitacional e urgência em executar as verbas do PRR.
Os sucessivos alertas são reflexo da incapacidade deste governo. Não nos acomodemos! As famílias não podem, simplesmente, exasperar. No centro das atenções deve estar o aumento do número de famílias a viver em condições desumanas, do valor das rendas ou dos casos de sobrelotação habitacional.
A carência habitacional não se fica sozinha, faz-se acompanhar por outros flagelos. Segundo o Estudo “Habitação Social na UE e em Portugal: Situação atual e desafios futuros” do Observatório da Cáritas, “o acesso à habitação condiciona muitas dimensões da vida de cada família, incluindo o estabelecimento de relações sociais, o enquadramento para uma boa aprendizagem das crianças e a possibilidade de os adultos se aproximarem de melhores postos de trabalho. O acesso à habitação merece assim um lugar central na discussão pública e a Cáritas quer contribuir para esta reflexão.”
É, por isso, urgente passar das palavras à ação. A aflição das famílias é tão mais sentida a cada anúncio que ecoa, basta atender aos pedidos de informação que chegam às Juntas de Freguesia, às Câmaras Municipais e, com toda a certeza, às entidades governamentais. Chega a ser cruel, ouvir anunciar sem qualquer pudor a construção de habitação, como dado adquirido, sabendo que dificilmente se concretizará.
Em todo este processo, o tempo perdido não se recupera, uma lição básica da economia. O curto tempo que resta associado à escassez de mão-de-obra, às dificuldades logísticas que tais empreendimentos acarretam, fazem-nos crer que dificilmente todos os anúncios sairão do papel. Oxalá me engane. Oxalá, mesmo! Aqui estarei para reconhecer o engano e felicitar todas as famílias que virem as suas dificuldades ultrapassadas.
Porém, no rumo em que a Região vai e ao ritmo a que vai, não auguro boas notícias. Para fazer acontecer é necessário mais e melhor. E tal passa, obrigatoriamente, por aumentar o número de habitações disponíveis, colocando no mercado habitações existentes, reabilitando habitações degradadas e incentivando a construção de novas habitações para venda ou arrendamento.
Para que este desiderato se concretize é necessário tomar decisões e avançar. A habitação deve ser uma das prioridades da governação nos Açores, não nos anúncios, mas sim na execução. Casa precisa-se (ainda)!