Nos Açores, assistimos, nas últimas duas décadas, à criação de uma moderna rede de equipamentos e de infraestruturas culturais, a par de um conjunto significativo de transmutações no setor cultural e criativo.
O surgimento de novas entidades pautou-se por uma vitalidade crescente, com múltiplas atividades a decorrer nas várias ilhas, resultando na renovação do setor associativo, no eclodir de novas formas artísticas e no desejo de jovens com formação específica (e superior) em querer fixar-se na região e desenvolver o seu trabalho a partir deste território.
A abertura dos apoios nacionais aos agentes culturais açorianos (em 2018) fez com que o caminho profissionalizante se operasse com outro fulgor, repondo equidade e justiça no acesso a condições e oportunidades idênticas aos restantes profissionais em território nacional.
Este caminho de modernidade (de crescente profissionalização) não retira responsabilidade às instituições públicas regionais. Bem pelo contrário. Implica-as, sobremaneira, agindo em complementaridade com o financiamento externo, sem excluir ninguém, por forma a dar a melhor resposta às exigências e ambições dos artistas, das entidades e de um público mais exigente.
É necessário perspetivar o futuro sem negligenciar o passado, no equilíbrio entre a riqueza identitária que nos une (e diferencia) e a contemporaneidade que habita o presente, conscientes das assimetrias e das idiossincrasias de um território geograficamente disperso, o que, ao invés de se constituir como uma fatalidade, deverá ser encarado como um desafio permanente a que temos de saber dar resposta.
Para atribuir significado ao que aqui defendemos, são necessárias e fundamentais políticas culturais adaptadas a este tempo, às instituições e à pluralidade de agentes e atores que interagem neste palco multifacetado.
É por esta ideia de futuro que devemos pugnar, pelo investimento e pela capacitação continuada dos indivíduos, como cidadãos/criadores informados e interventivos nas suas comunidades, atentos ao seu território, mas abertos ao mundo, ao invés de um olhar que interpreta o indivíduo como uma audiência ou uma massa amorfa (de consumidores culturais).
A Cultura permite diferenciar o território e tem um papel decisivo na qualificação da oferta turística. A vida cultural das diversas ilhas da Região, incluindo o património, é um dos principais impulsos que levam as pessoas – tanto residentes, como turistas – a querer conhecer o(s) lugar(es).
No tempo (histórico) em que nos encontramos, é necessário e fundamental que a Cultura assuma um papel primordial na estratégia de desenvolvimento social e económico da Região.
Esta é uma síntese do texto que fundamenta a monção setorial que submeti ao 19º Congresso Regional do Partido Socialista e que foi aprovada, por unanimidade, no final de Novembro, na reunião do Conselho Regional, a qual assume um caráter ainda mais prioritário, quando ficamos a saber que as famílias açorianas são as que menos gastam (despesa total anual média por agregado), em lazer, recreação desporto e cultura, em comparação com o restante território nacional (€534 Açores, contra €652 na Madeira e €861 no Norte, e abaixo da média nacional: €795. Dados do INE, retirados das Estatísticas da Cultura - 2023).
Tal como já pugnei, em múltiplos contextos, urge dotar o setor cultural de maior autonomia na esfera governamental, alterar a arquitetura do seu funcionamento (organização e estratégia), capacitando-a com um orçamento que o dignifique e que seja capaz de responder a quem, neste setor, trabalha. E que, desta forma, possa contribuir (ativamente) no combate às crescentes desigualdades (regionais e sociais).