Texto integral da intervenção do presidente do Governo dos Açores, Carlos César, na sessão do Congresso Estadual de Massachusetts, destinada a celebrar o Dia da Herança Portuguesa, na qual foi convidado de honra e distinguido com o "Portuguese Heritage Award":
"É uma grande honra e um verdadeiro privilégio voltar hoje aqui na qualidade de orador convidado da vigésima terceira edição das celebrações do Dia da Herança Portuguesa da Comunidade do estado de Massachusetts.
Permitam-me, pois, que agradeça este simpático convite, muito em particular ao Representante Bob Correia, enquanto Presidente do Comité Legislativo do Dia da Herança Portuguesa, assim como a todos os seus membros.
A escolha do Presidente do Governo Regional dos Açores para falar em nome de Portugal nos Estados Unidos é também uma forma de reconhecimento e de celebração do papel histórico e estratégico dos Açores no quadro das nossas relações bilaterais. Por isso, agradeço igualmente a todos quantos tornaram este dia possível.
Dentro de cinco dias, a 10 de Junho mais concretamente, comemoramos o Dia de Portugal, de Camões - o poeta das Descoberta e da epopeia marítima - e das Comunidades Portuguesas. É o dia em que celebramos a consciência de ser Português em todas as suas dimensões - o "ser português", se me é permitida a expressão.
Tal como sucede hoje neste magnífico e prestigiado templo da Democracia, é, pois, tempo de cumprirmos a tradição de honrarmos a nação e todos aqueles que contribuíram para a sua história ou que contribuem para o seu presente.
É também a altura indicada para sublinharmos simbolicamente e de forma sentida o esforço formidável e decisivo de todos quantos - como muitos de vós aqui presentes - continuam a lutar para relembrar e manter viva uma herança de séculos, independentemente do país onde vivem, em nome da memória dos seus antepassados e da nossa história colectiva.
Este esforço tem de ser constantemente relembrado enquanto elemento vital da transformação de Portugal no país que é presentemente. Ao longo da nossa história de mais de oito séculos, temos sido uma nação em constante diálogo com outras culturas e tradições, por escolha e por necessidade, num processo que passou a fazer parte do nosso modo colectivo de ser.
Fomos marinheiros destemidos na procura de novos continentes, fomos pioneiros e povoadores corajosos, como aconteceu por exemplo no Havai, viajamos pelo mundo e pelos mares em busca de aventura e de melhor ventura, da Ásia à África, da Europa ao continente Americano - com sucesso, na maioria das vezes, e com algumas desilusões, por vezes, mas sempre com um profundo sentimento de pertença.
Está inscrito no nosso código genético que Portugal será onde houver uma memória portuguesa, onde quer e quando quer que uma comunidade de origem portuguesa relembre os seus antepassados e honre a sua história. Celebrar Portugal é, por isso, uma experiência ainda mais significativa quando é determinada pelo coração e não apenas pelo local de nascença ou de residência.
As nossas comunidades emigradas constituem um trunfo importante do País que somos hoje, promovendo, com sucesso e de forma digna, a nossa herança comum, e desempenhando um papel decisivo na nossa actuação internacional enquanto nação conciliadora e cooperante, empenhada diplomática, comercial e culturalmente na prossecução de um mundo aberto, livre e democrático.
Se isso é verdade para as nossas comunidades espalhadas pela Europa ou pela América do Sul, torna-se ainda mais evidente aqui, nos Estados Unidos, país com o qual mantemos uma duradoura parceria fundada em relações de amizade, respeito mútuo e admiração, mas também em princípios e objectivos estratégicos comuns.
Um dos recursos mais importantes de Portugal no que à sua Política Externa diz respeito é, sem dúvida, a sua dimensão atlântica, que lhe é garantida primordialmente pela localização geo-estratégica dos Açores. As nossas ilhas têm sido, e continuam a ser no âmbito do Acordo de Cooperação e Defesa de 1995, um elo territorial vital entre Portugal e os Estados Unidos, constituindo igualmente uma componente reconhecida do consenso Euro-Atlântico.
A História é também muito clara neste particular. Desde o século XIX, os Açores têm sido essenciais para a estabilidade no Atlântico. Particularmente depois da Segunda Guerra Mundial, as nossas ilhas moldaram e modelaram o relacionamento luso-americano, dando origem a uma aliança internacional que conta já com mais de meio século.
As facilidades concedidas na Base Aérea das Lajes, na ilha Terceira, são essenciais aos esforços militares dos Estados Unidos em África e no Médio Oriente e servem de testemunho evidente do nosso empenho para garantir a solidez e o sucesso desta nossa parceria.
Mas os Estados Unidos e os Açores estão também solidamente ligados por laços afectivos, numa relação histórica que importa celebrar igualmente nesta ocasião. Para os Açorianos, enquanto Portugueses ilhéus do Atlântico, a Europa tem constituído uma referência política crescente mas é com os Estados Unidos que mantemos uma associação emocional de carácter permanente. A nossa nacionalidade e a nossa pertença europeia não ofuscam o lugar deste país nas nossas vidas e nos nossos corações.
Não se trata de uma questão de quem chefia o Governo ou de que Política Externa deve ser posta em prática, com maiores ou menores consequências; é antes uma relação mais profunda, fundada e presente hoje na vida de centenas de milhar de pessoas por todos os Estados Unidos e, em particular, neste estado.
Esta é uma das principais razões pelas quais é dever de Portugal apoiar continuamente um diálogo permanente e frutífero com os representantes das nossas comunidades, fornecendo-lhes as necessárias ferramentas diplomáticas com vista à preservação e à promoção das suas origens, e, muito em especial, assegurando os meios necessários à perpetuação de Portugal junto das novas gerações de luso-descendentes.
Em relação aos Açores, posso assegurar-vos que prosseguiremos uma política afirmativa destinada a trazer às nossas comunidades, não apenas o conforto da nossa presença, mas também o eco de uma Região nova, moderna e dinâmica - os Açores estão hoje diferentes, diferentes para melhor.
Gostaria também de assinalar uma feliz coincidência que, este ano em particular, confere um novo significado à celebração da herança portuguesa nos Estados Unidos.
Do próximo dia 24 até ao mês de Setembro, a Smithsonian Institution exibirá, em Washington D.C., uma exposição grandiosa sobre os Descobrimentos Portugueses e sobre o papel desempenhado por Portugal no mundo, nos séculos XVI e XVII.
Entre uma impressionante colecção de mais de duzentas peças, provenientes dos quarto cantos do mundo e atestando o grande empreendimento dos nossos antepassados, poderá ser encontrada uma Coroa do Espírito Santo dos Açores, feita em prata lavrada e datada do século XVII.
Este projecto fantástico constitui igualmente uma forma simbólica, mas eficaz, de dizer que Portugal também é aqui e de vos fazer entrar em contacto com a história das vossas famílias, com as nossas raízes e tradições.
O facto de o poderem fazer num cenário como o do National Mall, no coração político deste país e num dos mais prestigiados museus do mundo, deve tornar-nos ainda mais orgulhosos do que habitualmente em relação à nossa herança cultural. Tal como escreveu um dia Pessoa, "esta é a magia que evoca a lonjura e a transforma em história".
Para concluir, gostaria de dedicar uma palavra de apreço a todos os que hoje recebem o Portuguese Heritage Award, felicitando-vos pelo bom exemplo que deram com o vosso desempenho nas mais variadas áreas de actividade.
Muito Obrigado."