Os Grupos Parlamentares do PS e do BE e as Representações Parlamentares do PCP e PPM na Assembleia Legislativa dos Açores apresentaram, esta tarde, em conferência de imprensa, na Casa dos Açores, em Lisboa, uma posição conjunta contra os ataques à RTP- Açores feitos pelo Governo Central.
Os partidos afirmaram que o Ministro Miguel Relvas anunciou, em Agosto de 2011, que a emissão da RTP-Açores seria reduzida para uma simples janela de 4 horas de emissão. Justificou a medida com a despesa excessiva do canal e a necessidade de reduzir custos. Instado, posteriormente, a apresentar estudos que fundamentassem a sua observação empírica, nunca o logrou ou quis fazer.
Os órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores instaram, na sequência destas declarações, o Governo da República a cumprir o serviço público de rádio e televisão de acordo com o que dispõe o atual quadro legal. Algo que, de forma alguma, pode ser assegurado no âmbito de um espaço guetizado no final do dia. A Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores discutiu e aprovou, por diversas vezes, resoluções em que se alertava o Governo da República para as suas responsabilidades legais no âmbito do serviço público de rádio e televisão nos Açores.
Nada disto alterou o propósito do Ministro Miguel Relvas de implementar a janela e assim iniciar o processo de liquidação da RTP-Açores. Assim, a RTP-Açores começou hoje a concentrar a produção regional entre as 17.30 e as 23.30. No âmbito desse processo, programas de serviço público como o Bom Dia Açores (que incluía reportagens de todas as ilhas) e o Jornal da Tarde deixaram subitamente de existir.
O Governo Regional avançou já com uma providência cautelar contra a implementação deste modelo e o que ele significa de desmantelamento e incumprimento das responsabilidades do Estado no âmbito do serviço público de rádio e de televisão na Região Autónoma dos Açores. Os partidos aqui presentes apoiam, inequivocamente, esta iniciativa do Governo dos Açores.
Organizámos esta conferência de imprensa conjunta em Lisboa - para a qual foram convidadas todas as forças representadas no Parlamento dos Açores, tendo o PSD e o CDS declinado o convite – para denunciar todo este processo de desmantelamento da RTP-Açores e defender a reposição da legalidade no âmbito das responsabilidades do Estado no que diz respeito ao serviço público de rádio e televisão nos Açores.
Não nos restam agora dúvidas que a atual crise económica está a ser usada pelo poder político central para rever, fora do contexto constitucional, a natureza e âmbito das autonomias regionais. O poder central trata, assim, de diminuir, de forma prática, as competências regionais, a eficácia da intervenção do poder regional e os mecanismos de reforço da identidade específica dos povos insulares integrados no Estado português.
A problemática em torno da RTP-Açores deve ser lida e interpretada à luz do contexto descrito no parágrafo anterior. A RTP-Açores, tal como todas as outras televisões autonómicas europeias, representa um poderoso e insubstituível mecanismo de afirmação da identidade comunitária e de coesão territorial. No caso específico dos Açores, este papel é ainda mais transcendente tendo em conta a grande descontinuidade do território e a modernidade da unidade política dos Açores.
Nestas circunstâncias, a RTP-Açores constitui um pilar fundamental para a afirmação da autonomia política dos Açores no âmbito do quadro legal que se encontra consagrado na Constituição da República Portuguesa. A RTP-Açores possui uma missão institucional de grande e insubstituível importância para a autonomia. Neste contexto, importa referir que não existe qualquer outro órgão de comunicação social, privado ou público, que possua verdadeira dimensão e difusão à escala regional.
Essa missão institucional passa pela defesa e valorização da identidade regional; pela proteção do pluralismo; pela difusão de informação de interesse e âmbito regional; pela promoção da inovação na área do audiovisual açoriano; pelo fomento da cultura e do património açorianos; pela parceria na divulgação da informação de âmbito institucional regional; pela integração e articulação, na área económica, do mercado interno regional e pelo serviço de difusão dos acontecimentos económicos, culturais, sociais e políticos locais.
Sem a RTP-Açores nenhum destes objetivos pode ser alcançado, na medida em que – importa também lembrar neste contexto - os canais televisivos de âmbito nacional não realizam uma cobertura específica aos acontecimentos e dinâmicas açorianas. Na comunicação social nacional o acompanhamento e a informação referente à vida comunitária açoriana - nomeadamente todos os processos políticos, económicos, culturais e sociais que resultam da identidade político-administrativa específica da Região Autónoma - é descontínua, centralizada e residual.
Neste âmbito não é racional decretar “o fim da História” para a RTP-Açores, algo que ficou assim escrito no relatório do grupo de trabalho nacional constituído para a definição do conceito de serviço público na comunicação social. Conclusão a que já tinha chegado, uns meses antes e sem necessidade de qualquer estudo prévio, o atual Ministro dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas.
A decisão de acabar com a RTP-Açores, transformá-la numa simples janela e proporcionar-lhe uma existência precária no âmbito de um período de concentração, no final do dia, dos programas em direto, constitui, pura e simplesmente, uma decisão política que visa enfraquecer o processo autonómico e a coesão territorial dos Açores. O culpado é só um e chama-se Governo da República.
A questão económica é um falso argumento. Neste caso é apenas o nome do biombo que o Governo da República utiliza para esconder as suas motivações revisionistas em relação ao processo autonómico açoriano. Nesta matéria é bom lembrar que a RTP-Açores, apesar de estar inserida num território extremamente disperso e ultraperiférico, é o canal autonómico mais barato da Europa Ocidental.
A solução “económica” para a RTP-Açores não é, certamente, destruir a sua integridade como canal televisivo e de rádio ou proceder ao despedimento de dezenas de trabalhadores com experiência e formação específica. Esta é a receita mais fácil de construir e de aplicar: implementar lógicas de gestão empenhadas em destruir valências, diminuir a amplitude diária dos “diretos televisivos” à custa da criação de guetos de funcionamento noturno e da centralização dos mecanismos de gestão e produção.
Mais difícil, mas infinitamente mais útil e justo para a comunidade açoriana, é desenvolver uma gestão empenhada em melhorar a quantidade e qualidade do serviço público regional de televisão e de rádio. Aumentar as receitas que podem ser obtidas através de uma gestão mais qualificada e ambiciosa, nomeadamente na área da publicidade (que representa, em média, 20 % das receitas dos canais autonómicos peninsulares), da produção e venda de conteúdos e da internacionalização do canal. Neste contexto, o Estado que se queixa da despesa realizada no âmbito da RTP-Açores é o mesmo que impede, de forma sistemática, a internacionalização do canal, nomeadamente junto da enorme diáspora açoriana da América do Norte.
As consequências práticas das opções e declarações públicas realizadas até agora pelo Governo da República indiciam, de forma clara, que este persegue os seguintes objetivos: reduzir despesas, bloquear o acesso a receitas próprias e redimensionar o serviço público de rádio e televisão regional a uma escala meramente residual. Ou seja, destruir a RTP-Açores enquanto instrumento ao serviço da autonomia política do povo açoriano e veículo fundamental da coesão social e da integração territorial da Região Autónoma dos Açores.
Este processo injustificável de liquidação da RTP-Açores, que se pode e deve inscrever no âmbito do processo de controlo e de intimidação da comunicação social que o Ministro Miguel Relvas vem desenvolvendo com afinco, não é para nós aceitável. Exigimos que o Ministro e o Governo da República recuem neste propósito. Exigimos o respeito pela Lei. Exigimos que a Autonomia açoriana seja integralmente respeitada.
A nossa presença aqui exemplifica bem a nossa determinação nesta matéria. Não deixaremos de exigir responsabilidades políticas graves a quem assim age contra o Povo Açoriano.