No próximo domingo realizam-se eleições legislativas antecipadas. Para muitos de nós este acto eleitoral não decide absolutamente nada, pois a maior parte das medidas a serem implementadas já constam do memorando da troika BCE, FMI e Comissão Europeia.
Nada mais falso!
Apesar do compromisso assinado por Portugal implicar um conjunto de reformas estruturais específicas, há uma larga margem de manobra que nos permite escolher o melhor caminho para implementar estas mesmas reformas.
É uma questão de verificar o que defende cada partido para atingir um determinado objectivo
Portugal tem de reduzir a despesa do Orçamento com a saúde, mas isso não implica que tenhamos de destruir o Sistema Nacional de Saúde, como defende o PSD, e obrigar os utentes a ir para o privado, onde têm de pagar pelo seu tratamento ou consulta, consoante a doença de que padecem. O PS, neste caso, optou pelo caminho mais difícil de tentar impor a disciplina e rigor nos hospitais, cortando nas gorduras e nos desperdícios.
É certo que este caminho tem custos imediatos de popularidade: Implica enfrentar corporações poderosas como as indústrias farmacêuticas e os interesses de alguma classe médica, fechar serviços ineficazes, mas que facilmente podem gerar o populismo de alguns agentes políticos, e implica, em alguns casos, aplicar taxas moderadoras baixas para pagar um ou outro serviço adicional.
É uma batalha necessária, que acarreta muitos custos a qualquer agente político, mas que é necessária ser travada para proteger um dos bens mais importantes da nossa civilização: o acesso universal e tendencialmente gratuito aos cuidados de saúde.
Alguns dirigentes e próximos do PSD também falam em modificar a forma de financiamento da Segurança Social, sugerindo, inclusive, que as pessoas, a partir de um determinado valor rendimento, deixem de descontar a totalidade para este sistema de previdência passando a descontar o remanescente para seguros privados. Infelizmente o que o PSD não explicou é que a lógica do nosso sistema de segurança social não é de cada um por si mesmo, mas sim uma lógica redistributiva. Os nossos descontos para a segurança social servem para pagar a reforma dos nossos pais e avós, tal como os nossos filhos terão de descontar no futuro para pagar as nossas reformas e assistência social. Se permitirmos que parte dos descontos obrigatórios para Segurança Social possam ser feito para os privados, como defende o PSD, para além de retirarmos do orçamento recursos necessários para pagar as reformas daqueles que trabalharam e descontaram toda a sua vida para ter uma recompensa justa na velhice, hipotecamos, à partida, a sustentabilidade da reforma futura, daqueles que não têm rendimentos para subscrever um seguro privado.
Ainda esta semana visitei um lar para idosos com excelentes condições, onde idosos carenciados, muitos doentes e/ou outros abandonados pelas suas famílias, tinham acesso aos melhores tratamentos e cuidados como outros com muitos rendimentos podem aceder. Este lar obviamente tinha contrato com a Segurança Social. A determinada altura dei por mim a pensar que, no sistema americano de previdência social ou num modelo de segurança social como aquele que o PSD sugere, estes idosos mais carenciados, sem acesso a seguros de saúde ou de reforma privados, ficariam à mercê do destino e do abandono.
Mais uma vez há um caminho mais difícil que pode e deve, necessariamente, ser escolhido, neste acto eleitoral, para assegurar a sustentabilidade deste sistema, que pode implicar no futuro o aumento da idade da reforma e restrições em alguns benefícios e abonos.
Muitos não compreendem o que está em causa neste acto eleitoral, fartos de pagar cada vez mais para sustentar o chamado “Estado Social”.
O que está em causa não é pagar mais ou menos para ter um “Estado Social”. É, sim, a sua existência. Uma vez perdida, talvez não venha a ser recuperada!