Opinião

Roer os ossos

O ECOFIN anunciou a abertura de um processo de aplicação de sanções a Portugal. O PSD e o CDS contaram aos portugueses a história da Carochinha. Colaram aos socialistas a responsabilidade pelas medidas draconianas que tiveram, constrangidos assumiam, que aplicar aos portugueses. Em uníssono disseram que foram os esbanjadores socialistas os verdadeiros responsáveis por todas a austeridade da governação de direita. Cortes nas pensões, cativação de salários, congelamento nas progressões, retirada de apoios sociais. Convenceram os portugueses de que tinham vivido muito acima das suas possibilidades. Instigaram a síndrome do prisioneiro. E os portugueses convenceram-se de que, se calhar, a historieta era a realidade. Todo aquele crédito fácil, à mão de semear. As férias em família. As comprinhas a mais. O vestido de que não se precisava. O velho sintoma de culpa. Que fez os portugueses acreditarem que, apesar de serem dos europeus com o mais baixo PIB per capita, andaram no laréu, a fazer vida de lordes. Com esta bestial desculpa o governo de direita apertou ainda mais o garrote. Mais do que exigiam os credores. Operou o cúmulo da austeridade. Nesta história de encantar, os partidos de direita surgiam candidamente como os endireitas do país, que fizeram o que precisava ser feito. Custasse o que custasse. Entretanto mudámos de governo, retomaram-se os feriados, os vencimentos e a dignidade dos portugueses. Que até essa lhe havia sido usurpada. O anúncio das sanções fez rejubilar a direita. A pergunta é porquê? Se as sanções se reportam à ultrapassagem dos limites do défice entre 2013 e 2015, período em que esta governou. E não os esbanjadores socialistas. Porém, o que sobra deste triste retrato é que serão sempre os mesmos a serem penalizados duas vezes. Antes pelo empobrecimento a que se votou o país em nome do défice, e agora pelo incumprimento que, apesar disso, se verificou. Uns comem o lombo, outros roem os ossos.