Opinião

Um Orçamento transformista

Na próxima semana será debatido, na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, o Plano e Orçamento da Região para o corrente ano. Trata-se dos primeiros documentos previsionais da XII Legislatura. E, dado o teor dos mesmos, estes merecem, desde já, a maior atenção de todos aqueles que gostam de analisar este tipo de matérias. Temos em análise, à distância de um clique, verdadeiras obras de transformismo político. Convido-vos, para comprovarem facilmente aquilo que afirmo, a perderem uns minutos a “googlar”.

I

A palavra chave é “Bolieiro”. Depois juntem a palavra “alianças” ou “coligações”. Em entrevista à RTP/A, em janeiro de 2020, Bolieiro, muito hesitante, lá admitiu as coligações pós-eleitorais com o CDS e PPM. Em outubro de 2020, em entrevista ao jornal Observador, as alianças admitidas já seriam só com o CDS-PP. Podia ainda remeter para a entrevista de Paulo Estevão à RTP-A. A tal entrevista onde Estevão, pura e simplesmente, arrasa Bolieiro. Política e pessoalmente! Mas isto, como sabemos, já faz parte da história da política açoriana. A realidade, isto é, o odor a poder, fez com que aqui chegássemos. As divergências, outrora inultrapassáveis, deram lugar a uma “manta de retalhos” que sustenta o XIII Governo dos Açores. E eis-nos, portanto, perante o orçamento n.º 1 da “manta de retalhos”. Um orçamento feito com demasiadas mãos e onde os pés – perante tantos erros, incoerências, contradições e omissões – foram também utilizados. Um orçamento que é uma autêntica amalgama. A preocupação foi apenas uma: despejar para o papel o rol de exigências avulso dos partidos que integram a “manta de retalhos”.

II

A palavra chave é a mesma. Agora juntem a expressão “contas públicas”. Terão, entre outras entradas, acesso à entrevista do Presidente Bolieiro à RTP/A ocorrida em fevereiro de 2021. Nesta, Bolieiro refere a sua preocupação com as contas públicas, com o legado recebido e com a dívida da Região. Ora, essas mesmas contas públicas permitem (pasme-se!), entre outros aumentos consideráveis da despesa, aumentar diversos apoios sociais; reduzir para 60 € o preço das viagens inter-ilhas; e baixar os impostos para os que auferem maiores rendimentos (o que eufemística e erradamente é apelidado de “choque fiscal”). Tudo isto diga-se, em nome da verdade, só é possível com uma dose grande de “transformismo” e muito contorcionismo político. Bolieiro sabe, tal como sabem os demais parceiros da “manta”, do caminho de convergência trilhado com a União Europeia em termos de PIB per capita; do nível de endividamento da Região ser muito inferior ao registado na Madeira ou na República; do facto das receitas próprias da Região serem superiores às despesas de funcionamento da administração regional; do facto da Região ter as mais baixas taxas de impostos diretos e sobre o consumo do País; ou ainda do facto do governo anterior ter deixado um saldo orçamental financeiro de 77,4 milhões de euros (a que se deverá juntar o valor de 73 milhões de euros resultante da devolução à Região dos aumentos de capital social da SATA), o que perfaz um total superior a 150 milhões de euros de receita extraordinária em 2021.

Muitos mais exemplos existem, mas estes bastam para evidenciar o que temos pela frente. Preparem-se para o primado da irresponsabilidade orçamental… e política!