Desde 2008 que os Açores passaram a integrar o roteiro espacial da Europa, com a instalação da estação de rastreio de lançadores da Agência Espacial Europeia (ESA) em Santa Maria (e não em 1999 como refere a estratégia agora em consulta pública).
Este foi um passo significativo dado por Carlos César e José Contente sob a determinação de Mariano Gago, que poucos, muitos poucos, nos Açores compreendiam e acreditavam. Podia minuciosamente recordar o gozo mediático por parte do PSD ao referir-se ao “contentor em Santa Maria” ou “o de acompanhar a partir de écrans o lançamento de satélite da Guiana Francesa”, mas com certeza hoje, e bem, a realidade mostrou o quanto anedótico eram as declarações de uns e não a estratégia política de outros.
Na sua essência das cerca de 22 páginas da Estratégia dos Açores para o espaço, está o histórico da implementação do setor espacial nos Açores, mas está ausente, com metas quantificadas, o futuro, sem receios de ser ousados. O trajeto realizado tem sido muito positivo com evidências de intervenção no setor público, nomeadamente parcerias com a administração pública.
Necessitamos de integrar nesta estratégia o compromisso do estímulo de um cluster económico na área dos serviços espaciais para utilizadores finais, que seja para além do “atrair investidores” ou “locais de ensaio”. Um cluster que crie e absorva (efetivamente) empresas beneficiando de um ecossistema fiscal e financeiro favorável (bem previsto nesta estratégia) e que possam exportar serviços criados a partir dos dados gerados pelas estações (e não só) - exportação sem custos ambientais. Sem empresas com sede nos Açores e recursos humanos, seremos um bypass da riqueza produzida pela tecnologia espacial da Estação de Santa Maria para empresas portuguesas e europeias.
Esse cluster tem que ser quantificado e ambicionado, sem receios, num plano de 10 anos, envolvendo políticas públicas ao nível da qualificação profissional, do emprego, das finanças públicas, da educação superior e não superior, investigação, dando assim razão ao referido na estratégia: “As tecnologias e aplicações espaciais têm demonstrado um enorme potencial para criar efeitos positivos (spillovers) em muitos outros sectores de mercado, com fatores de multiplicação para a economia real de até 8 vezes o montante investido”.
A referência a um capítulo “Projetos de interesse por parte da administração pública regional” é sintomático do bem que fazemos do uso da informação para valorizar a administração pública; porém, os projetos de interesse por parte do privado, estão numa qualquer empresa do continente – se em 2009 não tínhamos alternativa, no pós 2022 não criaremos alternativas?
Para além das empresas do continente, necessitamos ter nos Açores empresas que possam ser suas parceiras e outras concorrentes.
Sem empresas com sede na região que criem riqueza, ficaremos na fotografia, alimentaremos serviços para projetos públicos, teremos muitos parceiros (públicos) – importante alavanca na construção do caminho até hoje, mas precisa do privado para ser o caminho do futuro -, mas sem garantias que no fim de um ciclo universitário algum jovem terá motivações para se instalar ou regressar à casa. As ambições para 2030 não podem ser as que foram para 2020.
Necessitamos que nesta estratégia, que se quer ambiciosa, desde logo com metas quantificadas, contemple a geração de empresas e riqueza a criar para os próximos 10 anos a partir dos números de hoje (e estes quais são?).