Opinião

Eco

No notável e eloquente ensaio “Construir o inimigo”, o filósofo italiano Umberto Eco lembrava que “ter um inimigo é importante não apenas para definir a nossa identidade, mas também para encontrar o obstáculo em relação ao qual medir nosso sistema de valores e mostrar, no confronto, o nosso próprio valor. Portanto, quando o inimigo não existe, é preciso construí-lo”. A fórmula, embora tão antiga quanto o tempo, varia de intensidade e apresenta nuances. Desde a crítica às diferenças, à enumeração de múltiplos defeitos, tudo serve para, na prática, impedir discordâncias internas e criar a percepção da necessidade de união face à ameaça externa. Daqui decorre que a narrativa da coligação, testada e repetida ad nauseam, tem a óbvia vantagem de apontar como cúmplices todos os que não alinham acriticamente com um discurso - tão simples como infantil - que desresponsabiliza quem cá governa enquanto, simultaneamente, culpa quem, de fora, agiria malevolamente para prejudicar todos os que cá vivem. Foi a este exercício frívolo que assistimos no Dia da Região, sem cuidar sequer de refletir um pouco sobre o muito que depende de nós um futuro que, afinal, se constrói todos os dias.