Opinião

72 horas de (mais) contradições

31 de agosto, 16h30 e 3 de setembro, 16h00: exatamente 71 horas e 30 minutos. O tempo que decorreu entre a Visita ao Serviço de Urgência do Hospital do Divino Espírito Santo – Unidade Modular e a sua abertura ao público.
Chamado de Urgência do HDES, agora na estrutura modular em construção, o serviço disponibilizado aos açorianos desde o passado dia 3 de setembro oferece o equivalente ao SAU – Serviço de Atendimento Urgente -, ou seja, atende somente situações menos urgentes, classificadas como pulseiras azuis e verdes. Chamar de Urgência será, no mínimo, imprudente. Na verdade, os açorianos continuam a ter exatamente a mesma capacidade de resposta oferecida desde o dia 4 de maio, após o incêndio ocorrido no HDES.
De facto, o Governo Regional comprometeu-se, em julho, em reabrir o Serviço de Urgência no final de agosto. Foi pela voz do Conselho de Administração do HDES que a Diretora Clínica garantiu que a resposta aos casos menos urgentes, os azuis e verdes, seriam encaminhados para a USISM, ficando a nova unidade a responder aos casos que exigem cuidados médicos diferenciados hospitalares.
Na mesma data, a Secretária da Saúde reforçava este compromisso, dizendo que a principal preocupação do Governo Regional seria sair o quanto antes da CUF e deslocar os serviços ali prestados para o Hospital Modular, sendo esta a unidade vocacionada para a atividade de urgência de maior gravidade, dizia então a governante. Afinal, tudo se transformou.
Nada do que estava planeado foi cumprido, incluindo, tal como veiculado pela Presidente do Conselho de Administração da USISM, a necessária contratação de 20 enfermeiros, 25 assistentes operacionais e 2 técnicos de raio-X, ainda a aguardar por “luz verde da tutela”, evidência de que o que era necessário fazer para cumprir o prometido não foi feito.
A visita do passado dia 31 de agosto deixou clara a prioridade do Governo Regional, mais preocupado em iludir os açorianos do que em garantir a qualidade dos cuidados de saúde. Abrem ao público parte da estrutura modular e procuram fazer crer que temos um novo Serviço de Urgência. Pois não temos!
Continuamos a não ter capacidade de resposta para as situações mais graves, continuamos sem bloco operatório, continuamos sem unidade de cuidados intensivos. Esta é a nossa realidade, por muito que a queiram florear, e não serve os utentes do Serviço Regional de Saúde. No fundo, ao trazer os azuis e verdes novamente para a urgência do HDES estamos a afunilar todo o sistema quando o sistema tem menos capacidade de resposta. Uma unidade com 14 cadeiras na sala de espera, 5 macas e 7 cadeirões - com flexibilidade para trocar macas por cadeirões ou vice-versa, - não configura uma resposta à altura de substituir a capacidade instalada no serviço inativo do HDES nem o sistema articulado entre as várias unidades de saúde da Ilha de São Miguel.
No dia 31 de agosto, a Secretária da Saúde guiou uma visita em que o Presidente do Governo não esteve presente eximindo-se, mais uma vez, ao primeiro embate da comunicação social e da oposição. No dia 3 de setembro, (finalmente) o Presidente do Governo compareceu para a imagem, sem deixar de atropelar, de novo, a responsável pela Saúde, quando confirmou, de viva-voz, que afinal há mesmo um atraso, e empurrando os prazos “para o final do ano”.
Compreende-se, assim, o apelo da Ordem dos Enfermeiros para que se divulgasse antecipada e articuladamente a informação aos profissionais de saúde envolvidos na operacionalização do Hospital Modular face à inegável opacidade de todo este processo.
A informação não é consistente e é ocultada aos açorianos, aos partidos políticos, às ordens profissionais e aos profissionais envolvidos. É caso para dizer: não é o hospital que é modular, a informação prestada pelo Governo, essa sim, é modular, consoante a crítica pública e o contexto da resposta. Ora uma estrutura provisória passa a definitiva, ora a definitiva passa a provisória! Ora o prazo é final de agosto, ora é meados de novembro, ora já é o final do ano! Ora a “entrada” no Serviço de Urgências é feito através da Linha Telefónica, ora é feito no Hospital Modular. Um rol de contradições, em apenas 72 horas, exigia-se mais e, sobretudo, muito melhor.