Opinião

O futuro da UE

A União Europeia está em declínio e tornar-se-á irrelevante no futuro. Esta é uma tese inexorável com que nos deparamos com frequência no espaço público, manifestamente exagerada. Em 2025, acinzenta-se o projeto europeu perante os desafios internos e externos que se lhe colocam. A UE parece estar sozinha. No entanto, é justamente por estes desafios se apresentarem hoje à escala global que será necessário continuar a redefinir coletivamente a UE.
A União Europeia não é um ator unitário. Nunca o foi. Os diferentes níveis de integração na UE verificam-se em matérias tradicionalmente consideradas como reduto dos Estados-membros, seja o controlo de fronteiras, a defesa, ou a política monetária. Em 2022, os dinamarqueses votaram a favor da adesão à Política Comum de Segurança e Defesa da UE, após a Rússia invadir a Ucrânia. Na relação entre americanos e europeus, por exemplo, existe uma divisão histórica entre países mais ‘atlantistas’, como a Polónia, por oposição a países como a França, proponente da autonomia estratégia europeia.
Embora a UE tente falar a uma só voz, os interesses setoriais ou individuais dos seus Estados-membros pesam nas suas decisões. Ao nível da ONU, a UE procura coordenar permanentemente, através de milhares de reuniões anuais, as posições de 27 países soberanos. É um exercício diplomático de equilíbrio difícil, que nem sempre é possível. Por exemplo, em 2011, os países europeus não se entenderam na votação que aprovou a admissão da Palestina como membro de pleno direito da UNESCO. Ao longo da história da UE, existiu espaço para o desacordo, para o debate interno. Mas para além do consenso europeu parecer cada vez mais um processo lento, existem agora países que desafiam normas basilares da União, o que a enfraquece.
Hoje, Viktor Orbán está no poder na Hungria, Robert Fico, na Eslováquia, há possibilidade de Herbert Kickl se tornar o primeiro chanceler austríaco de extrema-direita desde a II Guerra Mundial, pesam os espetros do Rassemblement National na França ou da AfD na Alemanha. Vislumbra-se uma caminhada rumo a uma lógica nacionalista, onde os interesses nacionais se sobrepõem a tudo o resto. Creio que todos perderemos neste cenário. A Europa mudou e o mundo também, é certo. Mas se foi possível imaginar-nos e construirmos o projeto europeu, então será também possível desenvolvê-lo e adaptá-lo a esta contemporaneidade espinhosa. Serão inevitavelmente necessárias reformas internas, o que se avizinha difícil tendo em conta o atual contexto político na Europa. Contudo, só através da União Europeia poderão os países europeus continuar a ser relevantes internacionalmente.
O projeto europeu tem como pilares a unidade e a solidariedade, mas não valerá a pena idealizá-lo. Não é um espaço virtuoso, como defendem alguns. No seu ensaio Não Há Mapa Cor-De-Rosa. A História (Mal) Dita Da Integração Europeia, José Medeiros Ferreira afirmou que “contrariamente aos conceptualistas da Europa”, o que mais aprecia na UE “é o seu lado tratadístico, a sua natureza contratual entre Estados e cidadãos”. É esta sobriedade e clareza de análise que mais nos deve interessar neste momento.
Este ano assinalam-se os 40 anos da adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia. É tempo para o debatermos e repensarmos este contrato que nos une a 448 milhões de europeus. Há muito que se aponta o fim da União Europeia, premonição que nunca se realizou. Só poderemos enfrentar o atual contexto geopolítico no seio de uma União Europeia adaptada a um futuro quanto incerto como desafiante.