Opinião

Agarra que é docente

Como se já não bastasse a perseguição ao Rendimento Social de Inserção, categorizando a pobreza como se de um bando de “gatunos” se tratasse”, vem agora a extrema-direita apresentar ao Governo Regional dos Açores a criação de um mecanismo de combate às baixas fraudulentas, com base no pressuposto de que “se tem verificado o uso recorrente a baixas médicas, muitas delas alegadamente fraudulentas”. Acrescentam ainda na sustentação desta argumentação “que (as baixas fraudulentas) têm gerado graves prejuízos, quer no sector público, quer no sector privado, devido à falta de mão-de-obra que, na sua maioria, é difícil de substituir”. Até aqui, pese embora achar que este tipo de iniciativas demonstram uma generalizada obsessão por quem, por motivos vários, não está atualmente a trabalhar, não me indigno quanto ao facto de, num estado de direito, se fiscalizar o que quer que seja. 

Coisa diferente é o facto de, no preâmbulo deste Projeto de Resolução do CHEGA, surgir como argumento o seguinte: “A título de exemplo refira-se que, ao nível da educação, e em resposta a um requerimento do CHEGA, o Governo Regional veio informar que existem 308 professores que estão de baixa médica e 233 assistentes operacionais estão ausentes ao serviço por doença”. Mesmo com algum esforço, admito que desde o primeiro momento tive dificuldade em acreditar na inocência deste “exemplo”, mas, se dúvidas houvesse, a Senhora Inspetora Regional da Saúde, Dra. Ana Vasconcelos, dissipou-as quando em comissão e em resposta à questão colocada pelo CHEGA sobre “os critérios utilizados para selecionar os atestados que serão auditados”, anunciou que irão “seguir os critérios utilizados nas ações anteriores, nomeadamente na grande ação realizada em 2011 e 2012 na área da educação.”. Ora se isto não é perseguição, não sei então o que será! Porquê na área da educação? Porquê essa diferenciação? Porquê essa prioridade? Na verdade, desconheço se existem números que indiquem que na área da Educação o número de baixas médicas é substancialmente mais elevado do que na área da Saúde, dos Transportes, da Cultura, ou outra área qualquer, mas… e se de facto for? Será que este indicador não nos deveria obrigar a todos a refletir sobre as causas subjacentes a esse eventual “facto”?

Será que é de somenos importância o facto de mais de 60% dos professores portugueses sofrem de burnout, devido a fatores como a excessiva burocracia, a indisciplina e a sensação de não conseguirem acompanhar os alunos individualmente? Será que o facto de (segundo o relatório de Eurydice, 2021) Portugal se apresentar em primeiro lugar no ranking de stress no local de trabalho, onde 90% dos docentes se queixam de algum tipo de stress, não deveria fazer soar sinais de socorro na nossa sociedade, especialmente naqueles que têm o poder e a obrigação de tudo fazer para garantir uma escola saudável para todos os alunos?

Será que, numa Região como a nossa, onde a Educação tem acrescida importância no combate às desigualdades sociais e à pobreza extrema, esta é a melhor forma de motivar, respeitar e valorizar os nossos docentes?  

Termino citando Georges Braque, que já no século passado alertava as consciências mais adormecidas: “O futuro é a projeção do passado, condicionada pelo presente.”.