O processo de Autonomia dos Açores vive actualmente uma fase difícil. Nunca, como agora, foi tão importante definir quem está de um ou do outro lado – do lado da Autonomia ou do lado da subserviência –, porque nunca, como agora, o assunto foi trazido à discussão pública com ideias e posições tão bem definidas, e com rostos e vozes que as assumem.
De um lado, temos os Açores e os Açorianos que, como sempre, afirmaram a sua portugalidade enquadrada por um claro entendimento do que seja a Autonomia no contexto nacional: Portugal não é inteiro sem os Açores e sem os Açorianos. E os Açorianos entendem que a sua condição de serem Portugueses é inseparável da sua condição de serem Açorianos. A Constituição da República Portuguesa assim o entende e determina.
Do outro lado, temos alguns açorianos que têm vergonha de o serem e que, ao invés de pensarem pelas suas cabeças, assumem a condição de porta-vozes de um centralismo requentado de triste memória. Esses contentam-se com as migalhas da mesa do dono.
De um lado, temos o PS/Açores que, por meio dos seus órgãos legítimos, manifesta clara e inequivocamente aquilo que pensa que seja o interesse dos Açores e dos Açorianos. Do outro lado, temos aqueles que, submissamente – como o PSD/Açores e a sua chefe –, entendem que o interesse dos Açores e dos Açorianos são aquilo que as mentalidades mais centralistas lhes concedem. Ou seja, os restos. Para estes, os Açores continuam a ser as famigeradas Ilhas Adjacentes do salazarismo que, pelos vistos, continuam a existir na mente da Manuela Ferreira Leite.
O PSD/Açores entendeu eleger como seu chefe o actual Presidente da República, que a pouco e pouco vai assumindo o papel que, na verdade, nunca deixou de ser o papel do cidadão Cavaco Silva desde os seus tempos de primeiro-ministro de vários governos do PSD: moldar as autonomias regionais aos interesses partidários, e transformá-las em estábulos povoados de rebanhos mudos e obedientes. A líder do PSD/A, agora nesta falsa questão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores levantada pelo Presidente da República e por outros órgãos do poder centralista, abdica da sua condição de responsável na política açoriana, para vestir a roupagem que jamais enjeitou de fiel servidora do centralismo bacoco que os nossos antepassados, de há séculos, e a quem ninguém pode acusar de falta de portuguesismo, sempre questionaram. Berta Cabral é uma centralista com sotaque açoriano.
Ao contrário, o PS/Açores – que por uma clara vontade dos Açorianos é, além de um partido que defende, exerce, consolida e aprofunda a Autonomia regional, o responsável por um governo que, mais do que nenhum outro do PSD/Açores, levou ao máximo do que é possível, no quadro político e económico que é o nosso, o entendimento generalizado do que seja uma verdadeira Autonomia regional constitucional – entende, baseado no mandado claro e expresso do Povo Açoriano, que a Autonomia não é uma mercê do Estado centralista, mas um direito inalienável do Povo Açoriano, e deste modo um dever cívico de quem, legitimamente, aqui exerce o poder. Por isso, o PS/Açores, sempre que estão em causa os interesses dos Açores e dos Açorianos, não se entretém a fazer distinções filosóficas entre quem pode e não pode vir à luta pelos interesses que são os de todos nós, Açorianos. Seja ele um cidadão anónimo, um dirigente partidário, ou um responsável governativo.
O PS/Açores entende que o poder é para ser exercido, e que o poder autonómico regional não é uma dádiva do Presidente da República, seja qual for a sua obediência partidária, mas um direito de todos nós, emanado da vontade popular e consagrado na Constituição. Entende ainda que, nestes termos, se deve reconhecer os méritos de quem, no governo da República, entende que a Autonomia é algo para ser levado a sério, e ao mesmo tempo denunciar aqueles que querem fazer da Autonomia uma cereja cristalizada no bolo do poder centralista.
O PS/Açores revê-se nas declarações que, nesta matéria, têm vindo a ser proferidas pelo seu presidente que, por isso mesmo, é presidente do Governo dos Açores. Tomara o PS/Açores, ao invés, que os militantes e apoiantes do PSD/Açores, incluindo os seus deputados regionais, que são verdadeiramente defensores da Autonomia dos Açores no contexto nacional, se revissem nas declarações da líder do PSD/A que, numa disputa de interesse açoriano, prefere tomar o partido de quem é contra os interesses dos Açorianos, neste caso concreto representados por Manuela Ferreira Leite e Cavaco Silva.
Mas essa é uma disputa cuja solução virá, em breve, da vontade livre e soberana do Povo Açoriano.
Porque os Açorianos não são tontos. Todos nós o sabemos, e a História recente no-lo confirma. Por isso mesmo, contamos com os açorianos, de Santa Maria ao Corvo, para lembrar a Berta Cabral e ao PSD que, em 2002, o Governo Regional dos Açores pretendeu contrair um empréstimo extraordinário para fazer face às obras de reconstrução nas ilhas do Faial e do Pico, atingidas pelo sismo de 1998, mas que o Governo do PSD não o permitiu. Na Assembleia da República, os deputados do PS propuseram que fossem transferidos, do orçamento do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação, 20 milhões de euros do capítulo 50 destinados exclusivamente à Reconstrução. Os deputados do PSD chumbaram essa proposta. Obedientes aos interesses do seu partido, os dois deputados do PSD/Açores na Assembleia da República também. Ferreira Leite era, então, Ministra das Finanças.
A Lei da Estabilidade Orçamental, aprovada pela maioria governamental do PSD, abriu uma era de centralismo orçamental e de definhamento das capacidades autónomas das regiões insulares e do poder local. A pretexto do Pacto de Estabilidade, então defendido por Manuela Ferreira Leite, foi diminuída a autonomia financeira dos Açores. Corrompendo a Lei das Finanças Regionais, o “excesso de zelo” do Governo de direita do PSD e do CDS/PP, que então governava Portugal, impôs uma ditadura orçamental arbitrária que em muito prejudicou os Açores. Isto contraria o que a líder do PSD/Açores tem vindo a afirmar.
No que toca à defesa dos Açores e dos Açorianos, o PS jamais hesitará em lembrar, até mesmo a um PSD tonto e de memória curta e obnubilada, que sempre esteve, está e estará na linha da frente na defesa dos interesses dos Açores e dos Açorianos. Sabemos que incomoda o PSD o facto de não poder fazer o mesmo: o seu passado recente é demasiado desfavorável para que os Açorianos, precisamente porque não são tontos, possam acreditar nas promessas que o PSD agora faz a torto e a direito. Porque a verdade é um facto verificável: Berta Cabral sabe que o PSD votou contra a Lei das Finanças Regionais; que não foi capaz de influenciar o seu partido na votação final do Estatuto; e que não conseguiu impedir que o PSD nacional, a que obedece cegamente, enviasse o Estatuto para o Tribunal Constitucional. E sabemos nós que, de forma reiterada e irresponsável, o PSD, mantendo os mesmos protagonistas, nesta como noutras matérias, não pode vir agora dar lições ao PS, muito menos aos Açorianos. Já o dissemos e repetimos: os Açores não precisam de um governo do PSD, chefiado por Ferreira Leite, que esteja contra os Açores e os Açorianos, e a favor de outros interesses que não sejam os dos Açorianos.
Manuela Ferreira Leite seria uma péssima Primeira-Ministra para os Açores. E Berta Cabral, que o sabe e não consegue esconder, tem vergonha dela.