“Socialismo no Século XXI” é o título do livro que a Juventude Socialista lançou, em Lisboa, e que junta onze textos com o objectivo de contribuir para a discussão do que deve ser o socialismo e, simultaneamente, servir de referencial ideológico para as novas gerações políticas.
Colaboram no livro João Ferreira do Amaral, Ana Gomes, André Freire, Pedro Adão e Silva, Inês de Medeiros, Miguel Vale de Almeida e Carlos César, entre outros.
O livro, com um texto introdutório assinado por Arons de Carvalho, pretende reflectir sobre a evolução ideológica da JS desde os seus primeiros congressos até ao presente, para o que inclui os conteúdos das moções e das posições políticas neles assumidas.
Ao longo de onze capítulos o livro “Socialismo no Século XXI” debate temas como políticas de igualdade, imigração, economia, habitação e ordenamento do território, cultura, ambiente, Europa e a participação dos jovens na construção da democracia.
Carlos César defende a ideia de que a descentralização não tem alternativa dentro da esquerda democrática
No texto com que colabora neste livro, o Presidente do PS/Açores aborda a questão da descentralização, considerando-a um valor intrínseco da esquerda democrática, em cujo ideário não cabe, sequer, uma alternativa à realidade Região, que, nas suas palavras, é, “uma célula nuclear da edificação do Estado, ou mesmo de entidades supra-estaduais como a União Europeia, e uma verdadeira infra-estrutura de democracia.”
Remetendo a ânsia e a necessidade de descentralização à própria fundação do estado português, Carlos César sublinha que, “nas sociedades democráticas, as dimensões regionais e locais configuram uma vocação para compensar a natural perda de legitimidade dos poderes centrais – estes estão progressivamente integrados em níveis multinacionais e, por isso, mais afastados. A participação pública que mais facilmente se inculca naqueles âmbitos ajuda a validar e a dar maior autenticidade aos regimes democráticos. Quanto mais associadas estiverem as representações democráticas nacionais e europeias às aspirações e sensibilidades regionais e locais, e quanto mais estes níveis institucionais mais próximos das pessoas sentirem que se harmonizam, mas que partilham e influenciam esses poderes de nível superior, mais robustas ficarão as nossas democracias.”
Por outro lado, a globalização – ao impor políticas mais ou menos generalizadas – gerou fenómenos de emergência de reflexos e efeitos regionais, os quais, paradoxalmente, acabam por influenciar a evolução global do sistema.
“Subsequentemente” – diz Carlos César – “recorre-se ao neologismo glocalização, através do qual se pretende justamente evidenciar a complementaridade do que só nesciamente é contraditório.”
Advogando que as políticas regionais europeias devem ser pilares da coesão da própria União, chama a atenção para a importância de assegurar um nível executivo de proximidade para que se alcance o êxito.
“A determinação do que deve ser no futuro a política regional e local e em que medida as regiões e localidades influirão num novo paradigma de desenvolvimento e coesão depende essencialmente de dois factores: a repartição de competências entre os diversos níveis de poder e o grau de interdependência que seja possível criar entre todos os níveis de poder e as estruturas políticas que os corporizem”, realça o Presidente do PS-Açores.
Perante a erosão das fronteiras nacionais e das competências dos Estados, em matéria de Defesa, por exemplo, as competências reservadas aos países estão, do seu ponto de vista, a ser depreciadas em favor dos níveis superiores e inferiores de governação, num autêntico efeito “sanduíche”, para citar a sua própria expressão.
“Essa tendência é inevitável e, no circunstancialismo presente e próximo, é considerada, por uma corrente crescente de opinião entre os europeus, como uma condição de afirmação e competitividade internacional e, até, de sobrevivência”, escreve Carlos César.
“Ora, nesse encadeamento de progressiva desnacionalização, falar em Portugal de regionalização do território continental – ainda que em formato diferenciado do das suas regiões insulares e ou em prejuízo da actual arquitectura territorial e competencial da administração local – não equivale a um risco de fragmentação ou fragilização, mas pode, ao invés, constituir uma oportunidade de desenvolvimento multipolar, de racionalização, eficiência e convergência. Portugal precisa de mais Portugal na sua permanente construção”, diz.
Recordando que em Portugal consolidaram-se duas experiências de governo regional, nos Açores e na Madeira, cujo mérito é geralmente reconhecido e desmente, pela evidência, os que receavam que pudessem desagregar o país, Carlos César afirma que, pelo contrário, “é quase evidente que, se essas autonomias políticas não tivessem sido consagradas, o país estaria, pelo menos, fortemente atribulado na sua dimensão insular.”
Como escreve neste seu contributo para o livro da JS, “as vantagens, pois, da dispersão de núcleos de responsabilização e de autogoverno são muitas, e os perigos são conhecidos, escassos e controláveis. Portugal é um exemplo flagrante: quando centralizado não evitou a decomposição e, descentralizado, no que toca às regiões autónomas dos Açores e da Madeira, não correu riscos de fragmentação (outra coisa é a polemização, mas essa é fonte de vida em qualquer circunstância, e outra ainda são os melhores ou os piores governantes regionais, mas isso é defeito para cuja correcção a democracia é, por definição, chamada a perscrutar e a dirimir).”
Para Carlos César, “Portugal está, assim, incompleto na sua reconstrução institucional democrática e penalizado nas suas eficiências – apesar dos progressos que conheceu e conhece em todo o seu território – com a falta de oportunidades que as suas regiões continentais têm de dispor, com maior imediação, sobre aspectos específicos dos seus destinos.”
E o Presidente do PS/Açores concluiu o seu texto escrevendo que “é difícil encontrar uma razão para que a esquerda actual não esteja identificada com a descentralização, em qualquer lugar como em qualquer momento – é uma audácia perigosa pensar que esse princípio e esse valor possam ser suspensos, por razões conjunturais, do património das democracias. Os princípios e os valores não se adiam.”