Opinião

Faz sentido existir o “dia da mordaça”?!

Hoje é dia de reflexão. Já escrevi sobre a inutilidade deste dia. Mas a verdade é que ele existe. Ainda que não faça sentido nenhum. A reflexão só existe para quem decide votar no dia do ato eleitoral. Os eleitores que votaram antecipadamente, usando uma prerrogativa há muito prevista na lei, tal como os eleitores que utilizaram a ferramenta mais recente denominada voto em mobilidade não tiveram este direito/dever. No passado domingo, dia 23 de janeiro, segundo dados do Ministério da Administração Interna, 285.848 eleitores votaram para as eleições legislativas antecipadas, correspondendo a 90,51% dos 315.785 que se inscreveram na referida modalidade de voto antecipado em mobilidade. No dia em que estes quase 300 mil eleitores exerceram o seu direito de voto, houve campanha eleitoral, arruadas, comícios, etc… Foi, portanto, um dia normal de campanha eleitoral. Tal como já tinha sido assim em anteriores atos eleitorais. No entanto, continua na lei a existir o chamado dia de reflexão. Na teoria, consta que o dia serve para que os eleitores possam ter um período (dia) sem campanha ou influências e o aproveitem para, como o próprio nome indica, refletir sobre o seu sentido de voto. No fundo, para dar alguma distância no dia que antecede as eleições para que cada eleitor possa fazer um balanço e decidir o seu voto. Neste sentido, há várias limitações impostas por lei para forçar a criação de condições para essa reflexão. A Comissão Nacional de Eleições (CNE) proíbe qualquer atividade que possa toldar o sentido de voto ou de reflexão. Nas palavras da própria CNE, esta limitação abrange “toda a atividade passível de influenciar, ainda que indiretamente, os eleitores quanto ao sentido de voto, bem como a exibição, junto das mesas de voto, de símbolos, siglas, sinais, distintivos ou autocolantes de quaisquer listas”. Na comunicação social, por exemplo, é proibida a publicação de qualquer artigo que possa conter um fator de influência. Na prática, qualquer artigo sobre política pode entrar nesta definição e, por conseguinte, os jornais de sábado vão para as bancas com uma espécie de apagão sobre o mundo político. Segundo jurisprudência da própria CNE, que remonta aos anos 80, “não podem ser transmitidas notícias, reportagens ou entrevistas que de qualquer modo possam ser entendidas como favorecendo ou prejudicando um concorrente às eleições em detrimento ou vantagem de outro”. Acresce ainda que segundo as regras e entendimentos vigentes, os cidadãos  ficam impedidos de fazer campanha ou de tecer qualquer comentário político em público sob pena de incorrerem numa “multa não inferior a 100 dias, caso seja na véspera da eleição, ou com pena de prisão até 6 meses ou pena de multa não inferior a 60 dias caso seja no dia da eleição.” Dos anos 80 até agora, talvez por desconhecimento da CNE, o mundo mudou muito. Alguém já devia ter parado para refletir a respeito do dia de reflexão. Na CNE e na Assembleia da República. Não estará na altura de acabar com esta mordaça?