Texto integral da intervenção do presidente do Governo Regional dos Açores, Carlos César, esta manhã, na sessão de abertura do seminário internacional “As Regiões e a Globalização”, organizado conjuntamente pela Conferência das Regiões Periféricas Marítimas da Europa e pela Presidência do Governo Regional:
“É com interesse e entusiasmo que a Região Autónoma dos Açores recebe, a partir de hoje, os ilustres participantes no seminário “As Regiões e a Globalização”, numa organização conjunta da Presidência do Governo açoriano e da Conferência das Regiões Periféricas e Marítimas da Europa, com o alto e prestigiante patrocínio do presidente da Comissão Europeia, também do director-geral do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, do director-geral da Organização Mundial do Comércio, e com a participação da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e do European Policy Center.
Trata-se de um evento da mais alta importância, pela pertinência da sua temática central, pela qualificação e diversidade das entidades envolvidas, bem como pelo contributo que decerto trará ao desejável processo de aproximação e cooperação dos poderes regionais à escala mundial.
A escolha da nossa Região para palco desta relevante iniciativa, para além de uma honra, pode ser considerada uma homenagem de grande significado à nossa História, marcada pela centralidade atlântica que, durante séculos, nos pontuou como espaço de encontro e cruzamento de civilizações nas rotas marítimas e, mais tarde, aéreas, particularmente entre o novo e o velho mundos. Referenciados desde cedo como porto de abrigo, cobiçados pelos piratas e pelas superpotências, os Açores viram tantas vezes o Mundo passar por eles que, incitados pela escassez do território e pelo isolamento e tomados pela necessidade e pela aventura, partiram, também eles, à procura de melhores terras, melhores trabalhos e melhores futuros, permanecendo, ainda hoje, em comunidades exteriores significativas, em lugares como os Estados Unidos da América, o Canadá ou as Bermudas.
Presentemente, e porque o apelo exterior já não encontra muita razão de ser numa região que se modernizou, que evoluiu económica e socialmente, passámos a ser também um destino de acolhimento de imigrantes, provenientes de zonas distintas do globo, desde o leste europeu a Cabo Verde, passando pelo Brasil.
Assim, a Globalização, entendida enquanto dinâmica de aproximação dos povos, de permutas culturais e de complementaridades económicas – enfim, enquanto “mundialização”, como dizem os nossos amigos francófonos – é algo que faz parte da essência açoriana mesmo antes de se ter encontrado uma designação consensual para o fenómeno e, até, antes de o termos identificado como uma tendência ascensional ou marcante.
Não podíamos, por isso, deixar de responder de forma positiva ao repto lançado pela CRPM e de nos associarmos a uma iniciativa com estes propósitos e este carácter mundial, que procura, precisamente, relevar as potencialidades desse processo globalizante, fomentar a reflexão sobre as suas diversas vertentes – da Economia ao Ambiente, da Investigação e Desenvolvimento à Governação – contando, para tal, com valiosas contribuições de distintos representantes do poder regional europeu, sul-americano, africano e asiático.
Não existem dúvidas, naturalmente, sobre muitas das implicações negativas associadas à Globalização, particularmente nos campos económico e cultural. Digamos mesmo que a tendência para identificar a mundialização com a deslocalização, a massificação da produção ou a unificação do consumo – o que, aliás, é certo – faz normalmente esbater as vantagens inerentes a um mundo que se passou a conhecer melhor, que pode cooperar mais facilmente e que, sobretudo, pode, de forma conjunta, enfrentar com maior eficácia os problemas e os desafios que lhes são comuns e que só por essa via podem ser solucionados com eficácia e garantias.
A oportunidade de reflexão e debate que se abre neste “Seminário” deve ser aproveitada, a meu ver, para encontrarmos modalidades concretizáveis de cooperação entre as nossas regiões, de forma a globalizar as nossas aspirações, as nossas preocupações e as nossas boas práticas.
Sendo hoje uma realidade inevitável, a Globalização deve, contudo, ser um instrumento e não um fim em si mesmo. Recuperando as palavras pertinentes de Mário Soares, “tratando-se de um fenómeno inelutável, não tem sentido ser contra a globalização, da mesma maneira que não se pode ser contra a força da gravidade. Mas tem sentido procurar introduzir-lhe regras, lutando – como disse Mary Robinson em Porto Alegre, com a autoridade de comissária da ONU para os Direitos Humanos – por uma "globalização ética". Isto é: capaz de englobar uma dimensão de justiça social, de respeito pelos Direitos Humanos e também ambiental, tentando preservar os equilíbrios ecológicos da natureza."
Julgo que essa “globalização ética” bem pode ser o mote para os trabalhos que hoje se iniciam, ao enfatizarmos a proposta de o poder regional, à escala mundial, ser um espaço instrumental e operativo de difusão dessa escala alternativa de valores, de identidades, de caminhos e de pluralidades que – não menosprezando as componentes económica, financeira e comercial – pode contribuir para uma maior sensibilização para as questões do desenvolvimento sustentável, para uma gestão partilhada dos problemas ambientais e para uma visão mais solidária da governação.
Neste sentido, a parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, que agora se começa a delinear, e as experiências regionais de trabalho em rede, são elementos decisivos para o sucesso da proposta que vos deixo.
Os Açorianos ficarão honrados se, com a ajuda deste seminário e da vossa vontade, a nossa Região ficar associada, de forma tão oportuna e indelével, ao eclodir de um movimento regional cooperativo de dimensão mundial e de propósitos fraternos e universalistas.
Votos, pois, de bom trabalho. Muito obrigado.”
GaCS/JSF