Intervenção do presidente do Governo Regional dos Açores, Carlos César, na inauguração, esta manhã, em Ponta Delgada, da Morada da Escrita – Casa Armando Côrtes-Rodrigues:
“É a segunda vez que esta casa de Côrtes-Rodrigues é objecto de uma intervenção. Desta vez, trata-se de uma reedificação integral, visando uma nova proposta cultural na cidade de Ponta Delgada.
A “Morada da Escrita”, assim se chama, procura estabelecer uma representação colectiva de modo a atingir um valor simbólico mais vasto: isto é, referenciando-se, embora, na figura de Armando Côrtes-Rodrigues, desenvolve-se segundo um discurso museológico e museográfico que lhe confere uma dimensão alargada, numa infra-estrutura cultural com espaços reformulados que podem ter uma leitura complementar ou autónoma.
Com efeito, a contemporaneidade aqui proposta comporta tudo o que nos chega do passado, através dos textos, das imagens e dos sons, num ponto de encontro que não pretende ser neutro ou insignificante mas tanto quanto possível indagador. De uma certa forma, este lugar estimula o confronto com a obra de Armando Côrtes-Rodrigues, e por via disso, ou por causa disso, o confronto com a realidade através dos objectos seleccionados, das obras de arte exibidas e das actividades preconizadas.
A literatura, nas suas manifestações açorianas, surge como a grande motivação para esta Morada da Escrita, como um lugar simbólico onde deverão caber todas as subjectividades, com respeito pelas diferenças. Apesar de algumas reflexões produzidas sobre a literatura de expressão açoriana, as matrizes da língua portuguesa e da cultura europeia obstam à afirmação de uma identidade diferenciadora. É sabido, contudo, como a linguagem e a literatura são vectores determinantes para a construção de uma história comum, já que traduzem ou reflectem um conjunto de enunciados próprios das sociedades. É, também, e naturalmente, assim, no caso açoriano.
No prefácio à Antologia da Poesia Açoriana, publicada em 1976, o saudoso Pedro da Silveira escrevia que «…nenhum outro povo europeu tão minúsculo com o Açoriano, excepção feita do Islandês, aliás bem mais antigo e sempre mais livre, deu na poesia (podia acrescentar: e no conto) tão boa nota de si. Que Antero é de facto um grande poeta açoriano, como também o são Roberto de Mesquita, e Vitorino Nemésio, já se sabia. Agora, para quem só isso ou pouco mais alcançava, penso que ficará esclarecido que eles não são «ilhas» isoladas, únicas no «mar» da literatura açoriana».
É, pois, conhecido o valor operativo da identidade na partilha da memória e numa mundividência comum. A partir da escrita, ou também por causa dela, gostaríamos que, aqui, acontecesse uma contribuição, dinâmica e permanente, na reflexão sobre a açorianidade e sobre o nosso destino num mundo globalizado.
A Morada da Escrita será, portanto, um equipamento público, da Região, onde decorrerão, assim o espero, através da sua gestão necessariamente dinâmica, muitas e participadas acções de promoção do livro e de difusão da leitura, sobretudo destinadas aos públicos mais jovens. Trata-se, afinal, de uma iniciativa, entre as muitas outras que a Presidência do Governo, através da Direcção Regional da Cultura, tem em curso, que visa, também no âmbito da educação não-formal, combater a ileteracia e fomentar o gosto pela leitura e pela literatura.
Será, com certeza, uma casa de memórias, já que a história da nossa literatura é percorrida por personalidades cujo nascimento ocorreu nas nossas ilhas, ou que nelas renasceram para a arte literária, mas abarcará, igualmente, as mais variadas facetas da expressão escrita – no jornalismo (e lembro, a título de exemplo, Jaime Brasil), na banda desenhada (evoco, por exemplo, Eduardo Teixeira Coelho) e em outras áreas, com tantos outros.
Aqui virão poetas, escritores, ensaístas, actores, críticos, professores, estudantes, curiosos, entusiastas pelo desejo de aprender, de ensinar, ou apenas de ver, ouvir e pensar. Serão, todos, bem-vindos nesta morada.
Aberto ao público mais este espaço, a Direcção Regional da Cultura concentra-se, agora, em outros investimentos que estão em curso, como, aqui perto, o Palácio de Santana e o Recolhimento de Santa Bárbara, ou outros a lançar, como, na Ribeira Grande, de reabilitação e adaptação dos espaços da antiga Fábrica do Álcool a centro expositivo e criativo de artes contemporâneas, o qual tomará a designação de “Arquipélago – Centro de Arte” e cujo programa preliminar já aprovei.
Neste ano de 2007, em que contamos inaugurar a nova Biblioteca Pública e Arquivo Regional da Horta, avançaremos no processo conducente ao inicio da obra de construção de raiz do edifício da Biblioteca e Arquivo de Angra do Heroísmo, cujo projecto já foi seleccionado e será apresentado publicamente no próximo dia 1 de Fevereiro. Será, ainda, o ano em que estaremos a intervir em outras frentes, como na ampliação dos museus da Graciosa e dos Baleeiros no Pico, na requalificação do Museu Carlos Machado, na instalação de uma biblioteca em Santa Cruz das Flores, na Casa Pimentel Mesquita, ou na conversão em centro cultural e ambiental da Fábrica do Boqueirão nessa mesma vila. Este mês, de igual modo, será celebrado, entre a Câmara Municipal do Corvo e a Direcção Regional da Cultura, um contrato com vista ao apoio àquela autarquia para a construção, que se inicia nas próximas semanas, do Espaço Cultural Multiusos daquela mais pequena ilha dos Açores.
Não faltam, assim, muitas outras tarefas, noutros lugares, noutras moradas, dinamizando e apoiando as actividades culturais e defendendo e valorizando o nosso património artístico e cultural.
Hoje, demos à Casa Armando Côrtes-Rodrigues o conteúdo e o nome do futuro. Amanhã, continuaremos…
Obrigado.”
GaCS/JSF