Com particular denodo não há acção que o tempo não corroa. Este ente surdo às nossas súplicas e implacável no desfecho. Os que nada valem não tem por via dele a possibilidade de se apurarem. Mas a sua acção é capaz de mostrar a face invisível dos convencidos, de desgastar a simpatia dos sorridentes, e de desmascarar os ambiciosos. Há na passagem do tempo esta pérfida certeza. A da desvalorização do que se julgava conhecer. A máscara que ornamenta a face esboroa-se, e deixa saltar, por palavras aparentemente serenas, o fel escondido do bandido. Caídas as vestes, resta a indignidade de serem capazes de fazer o impensável, de dizer, mesmo que por palavras mal escolhidas, o que aos olhos de todos é um absurdo. E de no limite se tolherem nas indecisões. Vêm com passinhos pequenos, sorrateiros, explicar as suas muitas hesitações, as que antes se esforçaram por fazer parecer certezas. E porque chegam à ribalta pelo corredor estreito da perfídia, e porque ganham na secretaria o que perderiam se lealdade houvesse, sucumbirão necessariamente. Só eles, na sua solidão de sorrisos, são capazes de manter o engano. Porque não tem coluna vertebral rastejam, porque não tem integridade não a prezam, porque apostam na meta, nunca valorizam o percurso. Falam de assuntos que não dominam, corroem a casca do que desconhecem, alimentam-se da hipocrisia a conta-gotas. Tem entre os dedos o sal duma ferida aberta que lambem demoradamente, enquanto destilam ódio pelos que lhe são alheios, num afã de auto-limpeza. Mas só as árvores morrem de pé. A areia escorrega, demorada e persistente, na ampulheta, contando meticulosamente os dias que lhes restam. E, quando menos se esperar, a máscara, que seguram entre as mãos há demasiado tempo, confundir-se-á com a própria face. E o gesto de a descolar será, então, inútil.