Opinião

Abril sempre

Na primavera de 1974 muitas foram as esperanças depositadas no futuro de Portugal. O país abria-se ao mundo, enquanto se dava por finda uma guerra que matou e mutilou muitos concidadãos. A educação foi alargada a todos tal como a saúde passou a ser um direito de todos os portugueses. Os trabalhadores conquistaram direitos até então proibidos. Foram o 13º e 14º meses, os vínculos às entidades patronais, o apoio na maternidade, a igualdade de oportunidades, a dignificação das carreiras profissionais, a valorização dos salários, os direitos de aposentação, o direito à greve, entre outros. A implementação de políticas de proximidade através do poder local e a liberdade de expressão foram também importantes conquistas. Eram estes os ideais de Abril que levaram os corajosos militares à rua para derrubar um regime déspota e promotor de desigualdades a todos os níveis. O povo cedo percebeu o que estava em causa e, desde logo, deu o seu inteiro apoio ao Movimento das Forças Armadas nesta revolução dos cravos. Nestes trinta e oito anos a democracia portuguesa sofreu contratempos, com avanços e recuos, mas nunca esteve tão ameaçada como agora. Todos os dias o Governo da República impõe medidas que vão no sentido de desmantelar essas conquistas. Os trabalhadores a cada dia que passa perdem direitos que são inalienáveis, ou pelo menos eram até há bem pouco tempo. A desregulamentação do trabalho, a mobilidade de qualquer maneira, os encargos com os despedimentos a preços de miséria, o corte dos subsídios de férias e de natal, o congelamento das reformas antecipadas, o aumento desmesurado de impostos, são o pão não de cada dia. Depois vem a perigosa tentativa de liquidação do Serviço Nacional de Saúde e as restrições do acesso à educação. A reforma autárquica, feita a régua e esquadro sem qualquer respeito pelas especificidades, vai destruir, de uma forma indecorosa, a matriz identitária de muitas comunidades. Estas medidas não só colidem com o espírito de Abril, como foram elas o motivo pela qual os militares saíram às ruas deste país. E não me venham com a desculpa da troika, porque grande parte destas armas com que o Governo de Passos Coelho combate o seu próprio povo, estão para lá do exigido pelo memorando assinado com as instâncias internacionais. Compreendo aqueles que faltaram à cerimónia oficial das comemorações do 25 de Abril, porque ainda nos resta esse direito, o direito à indignação.