Opinião

Ai meu DEO! Que nos desgraças!

Na passada quarta-feira a Ministra de Estado e das Finanças anunciou, numa longa conferência de imprensa, que o Governo, em 2015, iria devolver aos pensionistas e funcionários públicos parte do rendimento perdido nestes últimos três anos. Segui atentamente a exposição da Ministra tentando perceber que milagre económico era este que permitiria devolver 20% do rendimento “subtraído/cortado” aos funcionários públicos e extinguir a contribuição extraordinária de solidariedade. Não fazia sentido, pura e simplesmente, tanta “benesse” aos eleitores, apesar de estarmos a menos de um mês eleições europeias. Ora, como o Governo da República não tem folgas orçamentais como não se cansa de anunciar, nem descobriu nenhum poço de petróleo no país - apesar dos seus colegas de partido nos Açores apregoarem que sim - logo estes anúncios “tão benévolos” tinham de ter um “truque”. Nestas matérias nada como recorrer à matemática e ao Documento de Estratégia Orçamental (DEO), página 43, apresentado genericamente pelo Governo e fazer umas “continhas”. Analisando o quadro resumo das medidas de consolidação orçamental para o ano de 2015 verificamos que, de facto, o Governo disse a verdade: vão devolver aos funcionários públicos e aos pensionistas 225 e 660 milhões de euros, respetivamente. “Mas com a verdade me enganas!” - Já diz o ditado - pois o Governo também anunciou uma poupança de 1.378 milhões de euros fruto de umas pequenas alterações dos impostos e taxas e de um corte nas despesas e gorduras do Estado. Mas todos estes dados são apresentados de uma forma enviesada, com objetivos notórios de provocar uma impressão contrariaria à realidade, senão vejamos: o valor em cortes aos funcionários públicos e em aumentos de impostos para 2015, não é de 1.378 milhões como anunciado, mas sim de 2.284 milhões de euros, aos quais deduzem a tal “devolução” de 225+ 660+21= 906 milhões de euros. Ou seja, na prática, o Governo não só não vai reduzir a austeridade, como esta irá aumentar, com todos os seus efeitos recessivos, junto das empresas e das famílias. Mas como é que esta austeridade será feita? Em primeiro lugar, através de medidas diretas, algumas anunciadas no início do ano, como o aumento das contribuições para a ADSE e outros subsistemas (75 milhões de euros), outras, no DEO, como o aumento de contribuições para a previdência social em 0,2 p.p. (100 milhões de euros), o aumento de IVA em 0,25 p.p., (150 milhões de euros) ou o aumento da Contribuição de sustentabilidade (372 milhões de euros). E em segundo lugar, através de cortes nos consumos intermédios do Estado (537 milhões de euros). Uma breve nota antes de os especificar – mas ao fim de três anos de cortes e mais cortes, que arruinaram o país, a classe média e as pequenas e médias empresas, agora é que se lembram em cortar em alegadas despesas de telemóveis e em estudos e consultoria!!!???? Infelizmente não funciona assim. Quem conhece a máquina do Estado sabe que está muito depauperada e que estas poupanças têm, geralmente, um efeito mais nocivo do que benéfico na despesa pública, pois, geralmente, traduzem-se em reduções de outsourcings a pequenas empresas locais, que geram emprego e, na perda de qualidade na decisão dos responsáveis da administração pública. Mas o maior problema está no que o Governo não disse, escondeu ou não quantificou. O emprego público vai diminuir, ou seja, mais portugueses sem rendimentos, outros serão requalificados, reposicionados, perderão suplementos remuneratórios ou aposentados, o que também quer dizer menos rendimentos. As indemnizações compensatórias para as empresas de transportes diminuem, o que quer dizer, obviamente, transportes públicos mais caros. Se depois de isto tudo ainda houver alguém com capacidade financeira, para consumir tabaco, refrigerantes, bebidas alcoólicas, do tipo, vinho ou cerveja ou comida com elevado colesterol, não sorria, porque esta felicidade poderá também pagar imposto.