Opinião

O homem que não fazia promessas

I. O homem que disse um dia “que se lixem as eleições” veio aos Açores em campanha eleitoral. O Passos Coelho dos últimos quatro anos, aquele a quem só interessava o País e a emergência das suas contas, aparentemente dá-se mal com o calor - o estival e o dos comícios e ações de campanha. Por isso, tem vindo a fazer-se substituir por outro Passos Coelho, o dos próximos quatro anos, muito mais arejado no que toca aos costumes políticos. Este último, o que veio aos Açores, tem por missão resolver tudo o que o outro não quis, não soube ou não pôde nos últimos quatro anos, mesmo que isso signifique sucumbir à tentação de prometer – o maior dos pecados para o Passos original. E se ele promete…! Viver melhor?! É nos próximos quatro anos. Pagar menos IRS?! Com certeza, é já para o ano. Garantir um preço mínimo para o leite dos Açores?! Oh meus amigos, já podiam ter dito, é já a seguir. Reverter a exorbitante taxa de Segurança Social que o Governo da Coligação aplicou aos jovens agricultores?! Então não, é mal voltar a ser Primeiro-Ministro. II. Há uma justificação oficial para esta mudança de atitude em relação ao poder. Por muito estafada que lhe pareça, caro leitor, chama-se Partido Socialista. A história é relativamente simples: o Passos Coelho candidato é o que o Passos Coelho político sempre desejaria ter sido, mas os danados dos socialistas –com um ADN composto apenas por moléculas gastadoras – obrigaram-no, durante quatro anos, a ser um Primeiro-Ministro austero, insensível e teimoso. Agora que, diz ele, o País está arrumadinho, as pessoas estão a recompor-se e a economia a reerguer-se, pode recuperar a alegria de prometer. III. A terrível ironia é que nem o País está melhor, nem a Coligação tem medidas para o melhorar. Segundo números da PORDATA, o risco de pobreza aumentou para níveis do início do século, subindo 1,5% durante o mandato da Coligação. O PIB também regrediu para os registos de 2003, enquanto o rendimento disponível dos Portugueses é hoje inferior ao de 2000. Por seu turno, o investimento está atualmente ao nível dos finais da década de 80 e a emigração é maior do que na década de 60. Já em relação ao emprego, e apesar da redução do desemprego de meio do mandato, o número de pessoas empregadas é hoje inferior ao de meados da década de 90. Se tudo isto for ainda culpa dos socialistas, a governação PSD/CDS-PP tem feito um péssimo trabalho a resolver; se, pelo contrário, já não puder ser imputado ao PS, então a Coligação não tem quaisquer razões para considerar o assunto resolvido. Seria, pois, de esperar que consagrassem os seus esforços de campanha à explicação do que não resultou e do que vão corrigir, se voltarem a ser poder. Isso implicaria naturalmente um vasto e detalhado conjunto de propostas, nascido da experiência adquirida. Continuam os Portugueses à espera, enquanto vão digerindo as avulsas promessas de redução disto e daquilo. IV. Em 2011, Passos alegou uma terrível herança escondida. Em 2015, a herança é dele. É essa a diferença entre o Passos austero e resiliente (como escrevem os politólogos de tarimba) dos últimos quatro anos e o Passos que já promete. Prometer tornou-se uma condição de sobrevivência.