Na semana passada coorganizei, em Bruxelas, uma conferência sobre Áreas Marinhas Protegidas e pesca recreativa. A iniciativa contou com a participação de pescadores recreativos, cientistas e representantes de instituições como a Universidade de Cambridge ou o NOAA (Administração Nacional para os Oceanos e a Atmosfera dos EUA). Trata-se de um tema de grande atualidade quer na Região quer na União Europeia. É, por isso, importante promover a partilha de informações e conhecimento acerca deste assunto. Antes disso, nos Açores, reuni com a Associação de pescadores recreativos e com a Federação das Pescas.
As Áreas Marinhas Protegidas são uma ferramenta fundamental para a conservação da biodiversidade, recuperação de habitats e manutenção de stocks. Em geral, esta ferramenta restringe toda ou, mais frequentemente, parte da atividade humana numa área definida. Quando todas as atividades humanas são restritas, geralmente referimo-nos a Áreas Marinhas Protegidas como Reservas.
A abordagem mais comum a uma Área Marinha Protegida (AMP) é limitar atividades de exploração, como a pesca profissional ou a mineração, permitindo, no entanto, a contemplação da paisagem e outras atividades não intrusivas. A maioria dos cientistas marinhos defende que 10 a 30%, ou mesmo mais, dos oceanos devem ter esse tipo de classificação.
Estima-se que cerca de 25 milhões de cidadãos europeus praticam pesca recreativa sendo que, entre estes, 8 a 10 milhões fazem-no no meio marinho. O retorno económico e social deste ativo é muito significativo. Alguns relatórios apontam para gastos superiores a 20 mil milhões de euros por ano em atividades relacionadas com a pesca recreativa. Independentemente de outras vantagens, as AMPs são aliadas das pescarias recreativas porque ajudam a garantir a existência do seu ingrediente principal: o peixe.
Na intervenção que fiz partilhei a minha experiência enquanto cientista uma vez que fui um dos promotores de áreas protegidas destinadas a limitar qualquer extração com exceção da pesca recreativa nos Açores. Havia várias abordagens de acordo com a área, mas um caso particular ficará para sempre na minha memória.
Na ilha de Corvo, a mais importante área de viveiro de peixes fica muito próxima da Vila. Do ponto de vista dos cientistas, como eu, esta era uma zona fundamental para a proteção da vida marinha naquela pequena ilha. Acontece que quando propusemos à população fechar aquela área, houve quase, senão uma “revolta”, pelo menos um alargado incómodo na ilha. O corvinos afirmaram que se se restringisse totalmente a pesca na área do viveiro, os anciãos não pescariam. E, na verdade, uma das principais atividades físicas para a geração mais antiga de homens do Corvo era fornecer um peixe de vez em quando para toda a família e pescado exatamente naquele ponto.
Hoje em dia, a pesca profissional é proibida na área do viveiro, mas, por fatores sociais e culturais, é permitida a pesca recreativa.
O sucesso das Áreas Marinhas Protegidas está precisamente em encontrar a combinação correta entre a proteção da vida marinha e seu uso sustentável. É por aqui que devemos seguir.
PS: As chamas voltaram a lavrar com grande intensidade no nosso país provocando mais uma tragédia. Manifesto as minhas condolências às famílias das vítimas e envio um abraço solidário e fraterno a todos quantos foram atingidos. Por fim, um agradecimento aos bombeiros que combateram, num cenário de grande dificuldade, aqueles incêndios devastadores.•