Opinião

Não deixar ninguém para trás

Em julho de 1996, sendo Primeiro Ministro o Eng. António Guterres (atual Secretário Geral da ONU), instituiu-se, em Portugal, o Rendimento Mínimo Garantido (RMG).
O RMG surge como resposta a uma recomendação do Conselho de Ministros da União Europeia de 1992 para que os Estados-membros reconhecessem o direito de todos os cidadãos viverem com dignidade e que, para o efeito, criassem recursos e prestações sociais.
Foi considerada "a primeira abordagem global para dar uma nova dinâmica à política social, nomeadamente ao tentar ultrapassar a enraizada tradição que consistia em promover uma mera assistência social discricionária em Portugal" corporizando o que se veio a designar-se como "Nova Geração de Políticas Sociais".
O nosso país conheceu com essa medida uma nova forma de fazer ação social, apoiada no desenvolvimento de competências e na autonomia dos cidadãos.
Esta medida e um conjunto de outras, entretanto implementadas, tinham como propósito promover o direito ao trabalho e a um rendimento mínimo, mas também promoviam o direito à educação, à formação, à saúde, à habitação, valorizando a igualdade de oportunidades, combatendo ativamente as desigualdades e a fragmentação social.
Em 2003, é revogado o RMG e substituído pelo Rendimento Social de Inserção (RSI), que passa a estar incluído no subsistema de solidariedade, mantendo o valor pecuniário e o programa de inserção. Contudo, traz alterações nas condições de elegibilidade, na contabilização dos rendimentos e no conceito de agregado familiar.
Ao longo destes 25 anos a prestação foi sofrendo várias alterações, com significados operacionais e na sua abrangência, quase sempre associadas a ciclos políticos, nomeadamente as que ocorreram em 2010, 2012 e 2016, que alteraram o valor de referência e introduziram a condição de recursos.
Também nos Açores esta medida foi estrutural no combate à pobreza e exclusão social, atuando como indutora do combate ao abandono escolar e promotora da capacitação, potenciando a integração de homens e mulheres no mercado de trabalho, atuando de forma decisiva no aumento da taxa de atividade feminina.
Sem prejuízo do que representou e representa o RSI em termos de inflexão nas políticas sociais, de ganhos na redução da severidade da pobreza e na promoção da igualdade de oportunidades, o caminho percorrido não é um caminho acabado.
Nesta altura, os especialistas defendem que é bem evidente a necessidade de reforçar o Estado Social. É também inquestionável o mérito do RSI. Mas acreditamos que, como defende o Professor Carlos Farinha Rodrigues, passados 25 anos, esta medida deve ser repensada, "precisa de ser reajustada aos novos tempos, precisa de ser consensualizada e precisa de ser explicada". Defende ainda que "Numa altura em que ao nível da União Europeia se estão a dar passos na implementação do Pilar Europeu dos Direitos Sociais, em que uma medida como o rendimento mínimo é estruturante desse pilar, acho que é necessário fazer uma rediscussão do que é o nosso RSI, o que é preciso fazer para o melhorar, o que é preciso fazer para lhe retirar esta capa negativa que muitos lhe puseram em cima e este é o momento para pensarmos nisso".
Essa avaliação deve resultar em alterações que aumentem a eficácia desta prestação social, assegurando que ela seja dirigida às pessoas que de facto necessitam e que tenha resultados, não só na parte da transferência de recursos, mas também no processo de inclusão na sociedade.