Opinião

A vitória da estabilidade ou "der Sieg der Stabilität"

Domingo os portugueses revelaram, de norte a sul (ilhas incluídas), a sua vontade de forma clara. Clara porque não quiseram deixar a qualquer interveniente a responsabilidade de interpretar a sua vontade. Clara porque não quiseram deixar margem para a construção de soluções de geometria desconhecida e variável. Ficou claro, por isso, que cabe ao Partido Socialista gerir os destinos do país nos próximos 4 anos.
Enorme responsabilidade. Sem margem para erros, nem desculpas.
Reconciliar os portugueses com as maiorias absolutas, é de facto urgente. Eu diria mais, compete ao Partido Socialista a missão de reconciliar os portugueses com os políticos e com a política. Esta oportunidade é de ouro. Não se pode desperdiçar.
Depois de sondagens que vaticinavam empates técnicos e "empatões", de comentadores que profetizavam vitórias em debates e em arruadas, de analistas que contavam cabeças de participantes em comícios, de animais de estimação mais ou menos fofinhos, o povo expressou bem o que quer.
Agora há um programa para cumprir. Há que encetar um combate sem tréguas às desigualdades sociais. Ajustar a educação às exigências dos nossos dias, investir na saúde dos portugueses e ter um sistema de justiça para todos. Desafios gigantescos, é verdade, mas o PS e António Costa já deram provas do que são capazes e os portugueses validaram as suas propostas.
No rescaldo desta vitória, que o "Público" intitulou na primeira página de segunda-feira como "A Maioria da Surpresa Absoluta", que tem gerado tanta análise e contra-análise, há para mim aspetos que foram verdadeiramente surpreendentes, há outros mais do que esperados e, entre estes, alguns verdadeiramente indesejados.
Começando pelos surpreendentes. A própria vitória do PS com esta maioria absolutamente estrondosa e arrasadora. Eu pessimista me confesso: acreditar e desejar a vitória sim, mas nesta versão absoluta e arrasadora ... não adivinhava. Não deixou de ser surpreendente a queda livre do CDS. As dificuldades eram esperadas, anunciadas e até desejadas por muitos, mas o desaparecimento da Assembleia da República talvez não. Francisco Rodrigues dos Santos foi claramente aglutinado e esmagado pelas desavenças internas, que geraram dissidências de peso, e que, à porta de eleições, desacreditaram o partido e o seu líder. Partiu fragilizado e terminou desolado e desalojado.
Não foi surpreendente o emagrecimento Bloco e PCP que padeceram pelas suas próprias mãos. Os portugueses responsabilizaram-nos pela instabilidade, pelo chumbo do orçamento e votaram útil. Mais do que esperado foi o crescimento do IL e do indesejado CH.
No entra e sai, vejo como negativa a saída de João Oliveira do PCP e como positiva a entrada de Rui Tavares do Livre.
Por fim, o PSD. O PSD saiu derrotadíssimo, seja sozinho no Continente, seja coligado nos Açores. De entre as análises à pesada derrota, inesperada por muitos, há um aspeto que me chamou a atenção, desde logo porque secunda aquilo que neste espaço afirmei a semana passada: os portugueses perceberam que o PSD só chegaria ao Governo com o Chega e nunca ouviram Rui Rio a afirmar taxativamente que assim não seria. Terá sido o bastante? Miguel Esteves Cardoso intitula de "Erro inesquecível" o fato do PSD ter tomado "em novembro de 2020, aquilo que ficará como a pior decisão laranjinha de todos os tempos, talvez a pior decisão de sempre de um partido político português: o acordo açoriano com o Chega."
Será?