A Direcção Regional da Cultura assinou com o Instituto dos Museus e da Conservação, no passado dia 5 de Outubro, um protocolo que visa a realização de uma exposição na Galeria do Rei D. Luís I, no Palácio da Ajuda, entre Outubro de 2011 e Janeiro de 2012, constituída pelo acervo do futuro Arquipélago - Centro de Artes Contemporâneas.
Esta iniciativa constitui prova inequívoca, do interesse e empenho da Região na promoção dos seus criadores, dentro e ‘fora de portas’. A concretização deste objectivo é um desígnio do programa do X Governo dos Açores e é, legitimamente, uma das reivindicações maiores da comunidade artística do arquipélago.
As limitações a que está sujeito o ‘mercado de arte’ nos Açores, associado a um falta de visibilidade e de reconhecimento necessários à evolução, que se impõe, na carreira de quem procura ‘crescer’, são elementos, mais do que suficientes, para que esta exposição seja reconhecida com uma conquista que visa romper e perspectivar para “fora das fronteiras da Região”, o trabalho de quem está confinado à geografias das ilhas.
Mostrar aquilo que por cá se produz é fundamental para quem cria. E por várias razões: pela abrangência com um público alargado e mais exigente; pelo confronto com a crítica especializada ou ainda como introdução a novos mercados.
Parte desta problemática reside no facto de, localmente, não existir, salvo raras e valiosas excepções, um trabalho aturado e profissional, no difuso mercado artístico, em torno da promoção dos criadores regionais. Primeiro, porque nem todos os artistas estão representados por uma galeria. Segundo, porque nem todos falam a ‘linguagem’ que se exige a um meio fortemente concorrencial (ou porque não querem ou porque não têm perfil para isso). Terceiro, porque não existem galerias, em número e com essa ‘vocação’, no espaço insular.
Não obstante o carácter e o funcionamento do mercado interno, no sector artístico, o que se perspectiva nesta mostra é «(…) um desafio para os Açores se mostrarem e valorizarem no exterior», parafraseando Jorge Bruno, o Director Regional da Cultura.
Mesmo e apesar de uma existência num local (ultra)periférico, longe dos ‘centros’, é possível estar em sintonia com a contemporaneidade, na medida em que «(…) passámos a estar ligados a todos independentemente do lugar, os recantos mais periféricos estão desencravados, o local está em contacto com o global: a cultura-mundo é a cultura da compressão do tempo e da diminuição do espaço». Mais isso não significa que exista, actualmente, uma ‘única’ cultura. «(…) Quanto mais o mundo se globaliza, mais particularismos culturais aspiram a afirmar-se nele. Uniformização globalitária e fragmentação cultural caminham a par» (G. Lipovetsky/J. Serroy in A Cultura-Mundo, Ed. 70, 2010). O nosso caso é, neste sentido, paradigmático.
Esta iniciativa marca - de forma simbólica - o arranque das actividades do futuro Centro de Artes Contemporâneas, a ser instalado na antiga Fábrica do Álcool, na cidade da Ribeira Grande, e cujo concurso público, para a empreitada de construção, será lançado até final do mês de Outubro.
Esta mostra incidirá sobre as peças disponíveis na Colecção de Arte Contemporânea da Região, que conta com um núcleo principal composto por cerca de três centenas de peças, cuja aquisição tem vindo a ser traçada ao longo da última década.
A Colecção é composta, essencialmente, por pintura e escultura, na sua maioria de criadores açorianos, mas onde figuram outros artistas nacionais e internacionais. É, nas palavras de Jorge Bruno, «(…) uma colecção representativa dos principais criadores açorianos, mas onde eles se confrontem com os criadores do exterior». Pretende-se que a mesma venha a constituir-se como referência e de visita obrigatória a quem nos visite.
É com base neste confronto de linguagens que podemos ambicionar a construção de um novo Centro, polivalente, que posicione a Região, também, como pólo criador. É uma questão de programarmos à ‘escala justa’.
Neste ponto, parece-me adequado citar Gabriela Canavilhas, a actual Ministra da Cultura, quando escreve que: «(…) A obrigação do Estado, num governo socialista, é garantir a liberdade, a pluralidade, a diversidade, a memória, o passado e o futuro da nossa identidade cultural - património herdado e aquele que queremos legar, em permanente regeneração. Essa é a grandeza e imprescindibilidade da arte (…)» (in Público 17 Set’10).
Há, no entanto, quem receie a “liberdade absoluta que a arte comporta”. Para outros, é uma questão de orgulho e de ‘marca genética’.
* Título de um livro de António Pinto Ribeiro, editado em 2009 pela Cotovia