Opinião

O ano em que nos despedimos dos Mários

Estamos a chegar ao final de mais um ano. É tempo de refletir sobre os factos que marcaram 2017. Para além dos acontecimentos políticos, que a seu tempo abordaremos, gostaria de salientar o desaparecimento de duas personalidades que tiveram grande importância para o que hoje somos enquanto país. Refiro-me a Mário Soares e a Mário Ruivo, o primeiro, um político de grande audácia e coragem, um lutador pela liberdade e um dos, senão o principal, construtor da nossa democracia constitucional. O segundo, um oceanógrafo com um percurso, a todos os níveis notável, ao longo da vida contribuiu para o reforço dos valores ecológicos, lutando por uma sociedade cientificamente informada e pela conservação dos recursos naturais. Promovendo e liderando múltiplas iniciativas e projectos no âmbito do ambiente e do mar. Os dois eram amigos fraternos. Tanto assim era que uma das últimas visitas de Mário Soares aos Açores, que recordo com saudade, teve lugar em janeiro de 2010, no Faial, no âmbito da inauguração do novo edifício do Campus da Horta da Universidade dos Açores. Naquela altura, foi atribuído o Grau de Doutor Honoris Causa, em Ciências do Mar pela Universidade dos Açores, ao seu grande amigo e camarada de luta, o Professor Mário Ruivo, um príncipe na defesa dos Oceanos. Mário Soares quis estar connosco ao seu lado. Esteve com a mesma paixão e entrega com que sempre esteve ao lado de Portugal e dos portugueses, apoiando as grandes causas. Nunca é demais recordar que, enquanto visionário da Governação, Mário Soares assumiu um papel importante desde 1998, quando assumiu a Presidência da Comissão Mundial Independente para os Oceanos. Ambos deixam um legado que espero que ajude a moldar o nosso futuro. Uma das principais características de ambos era resiliência, a este propósito recordo sempre as palavras de Mário Ruivo que afirmava que, por vezes, era necessário “manter as jangadas a flutuar em porto seguro e esperar para nos fazermos ao largo”, um lema inspirador, bem demonstrativo da sua combatividade e do seu optimismo inabalável. Num tempo em que a economia azul, a sustentabilidade dos ecossistemas e o combate às alterações climáticas são paradigmas de desenvolvimento, as ideias de Mário Ruivo e o seu legado não só mantêm uma perfeita clarividência, como devem inspirar-nos a continuar. Esta semana o Parlamento Europeu decidiu, sob proposta dos eurodeputados socialistas portugueses, dar o nome de Mário Soares a uma das salas do seu edifício em Bruxelas. Uma iniciativa que mereceu um vastíssimo apoio, facto demonstrativo do reconhecimento da Europa por uma vida dedicada à causa pública. A sala Mário Soares será no piso principal do Parlamento (3), ao lado da sala Aldo Moro. Para além das merecidas e importantes homenagens póstumas a estas duas figuras incontornáveis da nossa história recente, importa prosseguir o seu trabalho, honrando as suas vidas de combate. E, fazê-lo, é continuar a lutar todos os dias por aquilo em que acreditamos. É que como bem afirmou Mário Soares “em democracia só é vencido quem desiste de lutar”.